A espionagem em Portugal durante a II Guerra Mundial é o tema central de vários livros publicados por José António Barreiros. O mais recente “Traição a Salazar” resulta de uma investigação sobre a história, de uma organização inglesa desmantelada pela PVDE (antecessora da PIDE).
A rede Shell – uma organização da Special Organization Executive, (SOE) - estendia-se clandestinamente a todo o território continental e também a algumas colónias. Significava a violação da neutralidade e uma traição pois em Londres decorriam conversações oficiais destinadas a prever o que seria feito a nível oficial caso acontecesse uma invasão os alemã – A Operação Félix.
Aterrem em Portugal: Os dados que vão surgindo nas suas pesquisas confirmam que Portugal foi um dos grandes centros de espionagem durante a II Guerra Mundial?
José António Barreiros: Penso que é inclusivamente um dos mais importantes, tal como Berlim o foi durante a Guerra Fria. A neutralidade portuguesa ajudou a que o país fosse o local ideal de «rendez vous» para os agentes das potências estrangeiras envoltos na Guerra Secreta.
AP: Como é que o regime, que tinha aptidão e meios para controlar a vida dos seus cidadãos, conviveu com a presença e as acções dos agentes que as várias potências em guerra enviaram para Portugal?
JAB: Ao jogar no equilíbrio geométrico entre as forças contendoras Salazar deixava que impunemente se espiassem. Geria o melhor que podia as queixas do Embaixador Hoyningen-Huene e do Embaixador Campbell, respectivamente alemão e britânico. A tolerância consentida nesta matéria fazia parte do seu jogo de poder.
O mais recente livro de José António Barreiros aborda história da rede britânica Shell, desmantelada pela PVDE. A obra tem 145 páginas e é da editora Cofina.
AP: O seu mais recente livro aborda o caso que ficou conhecido como o desmantelamento da rede Shell. Trata-se de um operação que marcou as relações entre Salazar e as várias potências, mas também o imaginário dos portugueses.
JAB: A rede chama-se Shell devido ao envolvimento de empregados da Companhia numa operação clandestina destinada, através da sabotagem e da propaganda, deter um possível avanço alemão sobre Portugal. Na data em que foi montada a rede já essa possível movimentação, prevista por Hitler como a "operação Felix" estava cancelada. Como se sabe a rede seria descoberta pela PVDE e desmantelada mas ficou como memória discreta em muitas famílias portuguesas.
AP: Uma das personalidades portuguesas envolvidas na rede foi Cândido Oliveira, que inclusive dá nome a um importante troféu do futebol português. Foi preso e esteve no Tarrafal. Como é que um homem destes aparece envolvido numa rede deste tipo?
JAB: Cândido era jornalista desportivo e escrevia para a "Stadium" uma publicação subsidiada pelos ingleses. Era anglófilo. Tinha a seu cargo a organização da rede no campo dos clubes de futebol. E como era inspector dos correios controlava a rede postal e ma organização clandestina de radio-comunicações. Era o homem certo no lugar certo. Ademais casapiano.
AP: O cérebro britânico da organização "Jack" Beevor é referido muitas vezes como um amador e um ingénuo, razão porque a rede acabou por ser desmantelada de forma relativamente fácil. As suas investigações também apontam nesse sentido?
JAB: Beevor não via que o tenente Ribeiro Casais, dos serviços secretos da Legião estava a dar-lhe o "abraço do urso" quando ofereceu os serviços legionários para a organização da rede que o britânico montava com o apoio de gente hostil ao regime. Foi a rivalidade entre a PVDE e a Legião que fez com que aquela tivesse o maior gosto em denunciar este arranjo "contra natura".
Carlos Guerreiro
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