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sexta-feira, 8 de junho de 2012

Volfrâmio, o nosso ouro negro

No dia 7 de Junho de 1944 o governo de Salazar expedia uma nota para os jornais informando a suspensão total da extracção e venda de volfrâmio, tanto aos aliados como aos alemães. A curta nota resultava de anos de pressão aliada, com o objectivo de interromper a exportação daquele metal para a Alemanha.

Era o regresso da questão do volfrâmio às páginas dos jornais depois de um silêncio que durava há quase três anos. Depois de uma acumulação de notícias que anunciavam uma corrida à exploração deste metal e muitas outras relatando assaltos, roubos ou simplesmente situações bizarras, os Serviços de Censura tinham cortado o mal pela raiz.

Nota do Governo, publicada no "Diário de Lisboa" de 7 de Junho de 1944.
(Fundação Mário Soares)

Em 24 de Março de 1941publicaram uma recomendação – que funcionava como uma ordem – onde deixava claro o futuro das notícias sobre o tema: “Não deve ser autorizada a publicação de mais nenhuma notícia relativa ao recente aparecimento de volfrâmio e aos esforços desenvolvidos pelos povos para o explorar”.

Mesmo assim, e nos meses seguintes, os jornais foram insistindo no tema. Os diversos serviços de censura espalhados pelo país foram cortando tudo ou quase tudo.

Só em 1941 pelo menos quatro notícias receberam o célebre corte a azul da Censura, ocultando os acontecimentos da maioria dos portugueses.

Em finais de Novembro uma quinta em Alijó, “na qual existia o cobiçado minério” foi assaltada por “um numeroso grupo de indivíduos, tendo cercado a casa do proprietário. Houve nutrido tiroteio com a GNR. Dos assaltantes foram presos vários, alguns evadiram-se e quatro foram feridos”.

Em Dezembro intensificam-se o número de casos.

Logo no princípio do mês há tumultos em Pinhel, logo a seguir os serviços de censura cortam o “pormenor” das autoridades terem sido obrigadas a utilizar metralhadoras numa notícia que refere “motins entre duas freguesias vizinhas por motivo de pesquisas de volfrâmio, tendo sido necessário a intervenção da força armada”. O relatório não especifica em que zona do país isto aconteceu.

Sobre o Natal dá-se o roubo de volfrâmio a bordo de um navio… em pleno Tejo. Ao longo dos anos relatórios oficiais de diversas autoridades falam mesmo num clima de “faroeste” que se vive nas zonas mineiras.

Num país com um desemprego galopante as minas absorvem milhares de homens e mulheres. Procuram um ordenado mais elevado que noutras actividades e, se for possível, roubar ou contrabandear alguns quilos de metal. Vale mais que o ouro… e o sentido desta expressão não é apenas literal.

Mas porque subiu tanto o valor do volfrâmio, transformando-se na principal exportação portuguesa ao longo da II Guerra Mundial?

Muito do ouro que se acumulou nos cofres do Banco de Portugal, atravessou a fronteira para pagar as toneladas de metal que saiam das minas para as fábricas de armamento.

A invasão da União Soviética, pelos alemães, tinha-lhes cortado o acesso a este metal essencial para a preparação de ligas blindadas para tanques e outros equipamentos.

Os projécteis capazes de as atravessar também precisavam dele. Portugal e Espanha eram dos poucos fornecedores com que a Alemanha podia contar ao longo daqueles anos.

Para impedir que todo o volfrâmio chegasse àquele país também a Inglaterra passou a comprar todo o que podia. Não que precisasse, pois recebia-o dos Estados Unidos.

Por esta razão, e em termos diplomáticos, a questão do volfrâmio nunca saiu da mesa de negociações ao longo de todo o conflito.

Entre os documentos reunidos na Torre do Tombo referentes àquele período encontra-se o rastro das conversações e pressões que foram surgindo ao sabor das vitórias e derrotas nos campos de batalha.

Desde cedo os aliados querem cortar os fornecimentos de volfrâmio oriundos de Portugal e de Espanha para encurtar a guerra. Primeiro os britânicos, depois os americanos e finalmente todos os outros entabulam conversações, pedem esclarecimentos e exigem o corte dos envios.

Salazar alega, enquanto neutral, que pode fazer negócios com ambas as partes. O jogo resulta durante grande parte da guerra enquanto empresas mineiras portuguesas, britânicas, alemãs e francesas intensificam a actividade.

Os preços continuam a subir. Disparam. As minas tornam-se centros de disputa. Rouba-se, contrabandeia-se o que se pode. Fazem-se e desfazem-se fortunas.

Para controlar as exportações, os preços e acalmar tentações o Governo cria a Comissão Reguladora do Comércio dos Metais, por onde passava todo o volfrâmio.

Esta Comissão recebia o minério de todas as minas e depois repartia-o consoante os acordos comerciais que o governo tinha estabelecido. Com o passar do tempo o fornecimento à Alemanha foi diminuindo, mas a pressão aliada não.

Prometem-se corte no fornecimento de mantimentos. Só não são mais fortes as ameaças porque Portugal já tinha cedido na questão dos Açores. Mas não se consegue resistir para sempre…

Os britânicos, tal como sucedeu nas negociações relativas aos Açores, apelam ao cumprimento da velha aliança.

Por sorte ou por intuição Salazar anuncia a sua decisão de acabar com a exploração e o fornecimento de volfrâmio em 5 de Junho… Estávamos na véspera do Dia D.

Carlos Guerreiro

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