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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

O passeio à Exposição do Mundo Português de José Henriques

“O meu avô fala de um avião da guerra no diário dele. Acho que te ia interessar”, foi mais ou menos assim que fiquei a saber da existência do diário de José Henriques, um documento que iria seria mítico para mim durante algumas semanas.

José Henriques e a página do diário onde conta o passeio que fez à Exposição do Mundo Português. 

Quando finalmente a Ana Paula Henriques me apresentou o diário, percebi que estava perante um tesouro… Folhas grossas e grandes, quase tamanho A4, revelavam momentos do dia-a-dia de José Henrique numa mistura de notas sobre a compra de sacas de amónio, naufrágios, pequenas notícias, curiosidades e sabe-se lá mais o quê.

Estão ali duas, três ou quatro décadas de rascunhos de uma vida. É o testemunho de alguém muito atento ao que se passava à sua volta. É o testemunho de um português comum que não se deixa ir em conversas e gosta de tirar as suas próprias conclusões…

Entre as várias passagens encontrei uma que trata de um passeio pela Exposição do Mundo Português, que teve lugar em Belém em 1940. A mostra, que foi um marco do Estado Novo nos anos 40, abriu as portas no dia 23 de Junho e encerrou a 2 de Dezembro.

Tratou-se de uma espécie de glorificação da história de Portugal e também a afirmação do seu estatuto de Nação Imperial. Por ali passaram milhares de portugueses, mas também estrangeiros, muitos recém chegados de um França invadida pelas forças nazis. Entre eles encontrava-se por exemplo Antoine de Saint-Exupéry, que escreveu mesmo um texto sobre a sua passagem pela capital portuguesa.

José Henriques visitou a exposição, na companhia do cunhado, no dia do encerramento. Agradeço à Ana Paula Henriques ter-me autorizado a transcrever este momento do diário… O texto foi copiado tal como está no original… deixo-vos então com este “paceio”…


Paceio à Exposição do Mundo Português


No dia 2 de Dezembro de 1940 fui ver a exposição do mundo português em Belém na companhia do meu cunhado Manuel.; gostei imenço, tanto do paceio como por tudo coanto vi, e importantíssimo, desde o parque das atraçõis , ao grande valor significativo de todos os pavilhões aonde se vê os maiores feitos dos nossos heróis portugueses, vi a espada que segundo estória foi aquela com que Afonsso Henriques lotou com os moiros e todas as armas e instrumentos guerreiros antigos.

Até a pá de ferro que dizem ser aquella com que a padeira de Aljubarrota matou 7 Castelhanos.

Entre as nomerosas coisas dignas de nota, destaca-se o efeito da iluminação sobre um inorme repuxo, a nao Portugal que eu tive ocasião de visitar nesse barco grandioso nessa cravela que representa a navegação com que os nossos antepassados tornarão Portugal um paíz conquistador e colonizador – Do passeio à nao, foi das coisas que mais apreciei, a sala de ouro aonde se via as moedas em ouro de todos os reinados – a marinhagem vestidos com os trajos daquelas épocas! Tudo aquilo era surpriendente.

Inormes lagos com desenas de barcos de recreio, a gasolina  e outros tocados a pés e remos de todas as variedades. Às 11 e 23 minutos veio o snr general Carmona presidir ao encerramento das festas centenárias!

Em tão foi deslumbrante ver o lindo fogo de artifício e 6 bandas de músicas regimentais a tocarem a portuguesa e o povo a cantar juntamente nunca vi coisa que mais gostasse.

Foi realmente mais uma das grandes obras do estado novo – transportes por metade do preço de as partes do país, fica na memoria de todas as pessoas que virão.

José Henriques

5 comentários:

  1. Um prazer enorme, acompanhar este blogue.
    Esta postagem vale a "deslocação" até cá. Como sempre, aliás.

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    1. Agradeço as palavras... são um grande incentivo para continuar.

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  2. José Henriques era filho de um contramestre de um barco de comércio de longo curso. A sua mãe era conhecida pela Sra. "Mestra" e ensinou as pessoas da sua aldeia a ler e a escrever.
    José Henriques vivia em Ribamar de onde era natural e no dia 5 de Outubro de 1910, foi à Ericeira ver a partida da família real (rainha Dona Amélia e o Rei Dom Manuel II) para o exílio na Inglaterra. Com nove anos de idade, José Henriques, teve a oportunidade de ver a família real e de ver o primeiro automóvel nesse dia inesquecível.
    "Na praia da Ericeira, Dom Manuel embarcou... na praia da Ericeira diz certeira a vila inteira, Dom Manuel embarcou. Ressurgiu como subiu e a monarquia baixou..."

    Para quem tem curiosidade de saber mais sobre a "Exposição do Mundo Português de 1940" que o avô José Henriques teve a oportunidade de visitar e de relatar no seu diário, pode ver o magnífico documentário realizado por António Lopes Ribeiro:
    http://www.youtube.com/watch?v=2QdO6sXEoTI

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  3. Obrigado Ana por teres acrescentado mais pormenores à história do teu avó.... Um grande abraço.

    Carlos Guerreiro

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  4. Infelizmente, nasci dois anos depois da realização da Exposição. No entanto, quer os meus pais, quer os meus tios, me falaram bastante sobre ela e me deram programas da visita ao certame, dde que ainda conservo um. Perderam-se, entretanto, outras publicações da época, emitidas durante o período da Exposição.
    Ainda me foi possível ver de pé bastantes construções pré-fabricadas que faziam parte dos edifícios da Exposição.
    Lembro que o Jardim Colonial, localizado ao lado do Palácio de Belém, e que merece uma visita, foi inaugurado com a Exposição e nela integrado.
    Quanto à descrição feita no Diário do Sr. José Henriques, considero-a um testemunho extremamente valioso, para mais feito após a visita que efectuou e não muito tempo depois. É um bocaddo de História de Portugal. Só tenho a agradecer.

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