O livro vai revela ainda o ambiente de paz entre britânicos e alemães que se viveu no arquipélago durante grande parte do conflito. Para conhecer melhor esta obra que recupera memórias reais daquele período colocámos algumas perguntas ao autor.
Aterrem em Portugal: O seu livro tem por cenário os Açores durante a II Guerra Mundial. Porque escolheu este ambiente?
Joel Neto: Os Açores têm sido quase sempre o principal cenário dos meus romances. Talvez eu ainda não tenha esgotado o trabalho da identidade do povo das minhas ilhas, no que esta tem de próprio e, ao mesmo tempo, no que tem de exultantemente português.
Por outro lado, havia aquela história em concreto: a dos ingleses e alemães que haviam continuado em paz durante a II Guerra Mundial. Pareceu-me uma metáfora extraordinária, tanto para a guerra como para a paz. E um pressuposto poderoso: poderia a guerra ter sido evitada, afinal?
AP: Quando percebeu que havia assunto para um romance?
JN: Creio que os meus romances nascem de padrões. Têm nascido, pelo menos. Eu tinha a história dessas duas comunidades – entre outras mais pequenas – que estavam na Horta a desenvolver a telegrafia submarina e viviam em paz.
Depois apareceram-me os Clippers da Pan American, amarando em frente à cidade carregados de estrelas de cinema e campeões de boxe, estadistas e milionários. E depois começaram a despontar também no mar combates da Batalha do Atlântico a que os faialenses chegavam a assistir a partir de terra, alinhados na doca como num anfiteatro. De repente, havia um cosmo.
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AP: Descreve momentos de convívio entre britânicos e alemães em plena guerra. Trata-se de ficção ou realidade?
JN: Eles viveram de facto em paz no Faial até à evacuação dos alemães, em 1943. E os alemães só foram evacuados porque, percebendo para que lado a guerra ia tombar, Salazar cedeu instalações nas ilhas aos Aliados.
De resto, aquelas famílias eram visitas de casa umas das outras. Dançavam o foxtrot e o quick step nas sociedades recreativas (orquestras proliferavam). E havia ténis, e croquet, e piqueniques, e expedições... Era uma elite extraordinária.
Ao pé da Horta dos anos 1940, o resto do país – mesmo Lisboa – era sombrio, triste e profundamente tacanho.
AP: E a espionagem também é central no enredo?
JN: A história que move a personagem principal é a da possível presença no Faial, depois da guerra, de um operacional nazi. Eles esconderam-se por todo o lado, não foi? Porque não nos Açores também? Portanto, apesar de todas as linhas narrativas, creio que se pode dizer que a espionagem é a principal força motriz do romance. E Mr. Flavell gosta do gin do Peter Café...
AP: Sendo dos Açores, as histórias do tempo da guerra não lhe devem ser estranhas...
JN: Desde criança que ouço estas histórias, mas realmente nunca me tinha preocupado em determinar-lhes os contornos exactos. No fundo, a verdade ultrapassava em muito aquilo que eu imaginava. Não são só os portugueses em geral que não conhecem o papel da ilha do Faial naqueles tempos tumultuosos e extraordinários: são os próprios açorianos.
Portanto, o material era excepcional, mas restava o desafio de escrever um romance que transcendesse esse material e, ao mesmo tempo, o respeitasse. Tive a felicidade de encontrar os beta-readers e o fact-checkers perfeitos. Nunca poderei agradecer-lhes o suficiente.