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segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

«Escaparate de Utilidades»
Lisboa, o cais da Europa

 

L' Ilustration, 16 de Dezembro de 1939

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Quando Lisboa recebeu Vivien Leigh e Lawrence Olivier

Em Janeiro de 1941 os jornais portugueses exibiram orgulhosas primeiras páginas anunciando a passagem por Lisboa do casal de actores Lawrence Olivier e Vivien Leigh, numa passagem que os havia de levar para Inglaterra onde pretendiam colaborar no esforço de guerra.

Chamada de Primeira página do
jornal "O Século" de 8 de Janeiro de 1941
Olivier e Leigh tinham casado em segredo em Agosto de 1940, depois de divórcios bastante badalados, e eram ambos estrelas reconhecidas de Hollywood, apesar de tanto um como outro serem britânicos.

A presença na capital portuguesa do actor de “Monte dos Vendavais” e da actriz que recebera o Óscar pelo seu papel em “E tudo o vento levou” causou um reboliço pouco habitual no porto de Lisboa.

O casal chegou a bordo do navio americano Excambion depois de ter passado dois anos nos EUA, ainda neutrais, mas onde não se sentiam úteis à guerra ou protegidos devido às sua ideias.

Na América havia mesmo quem temesse pela vida dos dois actores que abertamente apoiavam Churchill e criticavam Hitler, irritando alemães, pró-alemães e isolacionistas americanos por igual.

Os jornalistas portugueses subiram a bordo e encontraram o casal a reunir malas e as descrições publicadas na maior parte dos periódicos é digna de qualquer revista cor-de-rosa dos nossos dias.

Lawrence Olivier regressava com a intenção de se juntar à RAF, pois tinha experiência como piloto. À chegada a Inglaterra seria desafiado para participar em mais um filme de propaganda e mais seria integrado na Fleet Air Arm, a Força Aérea da marinha. Nunca se viu envolvido em combate a até ao fim do conflito esteve envolvido no esforço de propaganda participando e realizando filmes com esse objectivo.

Ficam alguns detalhes das notícias publicadas em dois jornais da época: O "Diário de Lisboa" de 7 de Janeiro de 1941 e "O Século" do dia seguinte.

Parte da notícia do "Diário de Lisboa"
de 7 de Janeiro de 1941

Parte da notícia do Jornal "O Século"
de 8 de Janeiro de 1941
Carlos Guerreiro 

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Dora, o navio do inferno

Sabe V. EXª o que de vergonhoso se está passando à volta dos desgraçados refugiados do vapor Dora?

Se não sabe é conveniente que V. Exª se informe directamente e termine, de vez, com, um espectáculo que está envergonhando e desprestigiando o nosso país aos olhos de estranhos.

À volta desses infelizes, cujos únicos crimes são os de alguns serem ricos e todos judeus, tem-se agitado um bando de abutres. É que alguns deles ainda têm consigo uns milhares de dólares escapados à rapina.

Esse bando, em que já se inscreveram entidades de certo relevo e responsabilidades sociais, só largará aqueles infelizes velhos, mulheres e crianças quando estes, já exaustos, nada mais tenham para ser roubado.

Porque não se deixa partir aquela gente? Porque se levantam mil e uma dificuldades à legalização da sua situação? Porque prendem e não deixam em liberdade tratar da regularização dos seus papeis para poderes deixar o país? Porque isso convém ao bando que não se farta só com as grossas somas que já lhe extorquiu.

(…)

Snr. Presidente do Conselho:

(…) é indispensável que V. Exª intervenha imediatamente e varra do povoado a alcateia de lobos que farejam a presa inofensiva e indefesa.

Feito isto, terá V. Exª prestado mais um altíssimo serviço em prol do prestígio da nossa terra.

Um Português


O Navio Dora
(Foto: Dodenschip Dora)
Datada de 12 de Agosto de 1940 esta carta anónima, enviada a Oliveira Salazar, denuncia um dos muitos dramas que no Verão de 1940 tiveram lugar às portas de Lisboa, numa altura em que Milhares de refugiados viram na capital portuguesa o refúgio momentâneo para uma Europa que mergulhava definitivamente na guerra.

O Dora era um pequeno cargueiro com bandeira panamiana, propriedade de um armador grego, e que desde 1939 estava envolvido no transporte ilegal de Judeus da Europa para a Palestina e outros destinos no norte de África. Foi com o objectivo de chegar a Casablanca que, no dia 2 de Julho de 1940 saiu do porto de Cette, perto de Bordéus, onde fora fretado à pressa por um grupo de meia centena de refugiados que queriam fugir às tropas de Hitler.

Graças aos inesperados da guerra a viagem iria ser mais curta. Na rota do Dora agigantou-se o combate de morte entre as frotas inglesa e francesa. A 3 de Julho os britânicos atacaram os navios franceses amarados no porto de Mers-el-Kébir, no Norte de África, e destruíram a frota. Uma ação executada por ordem directa de Churchill que temia que os alemães se apropriassem dos vasos de guerra e ganhassem força no mar. Morreram cerca de 1300 marinheiros franceses e 300 outros ficaram feridos.

A tensão no mediterrâneo disparava e a rota do pequeno Dora passava pelo meio da contenda e foi tomada a decisão de não fazer esse caminho. Pouco depois de terem partido de França entravam no porto de Lisboa, onde as autoridades proibiram o desembarque dos 46 passageiros, enquanto estes não conseguissem vistos para prosseguir viagem para outros destinos.

Entre os refugiados encontravam-se os banqueiros Haim Bernstein com dez familiares, o banqueiro polaco Sokolow e outros refugiados vindos de países como a Holanda, a Bélgica e a França. A bordo encontravam-se uma criança de 3 meses, doze com menos de sete anos e 14 mulheres.


Um Inferno

Conforme as semanas passaram armador e passageiros acabaram a digladiar-se, com versões contraditórias, nos jornais portugueses e estrangeiros. Estes últimos depressa rebaptizaram o Dora de “Hell Ship”, o navio do Inferno.

Segundo o relato feita pelos passageiros a decisão de desviar a rota para Lisboa foi feita pelo comandante que temia pelo futuro do navio. Um banqueiro de nome Berenszteyn - talvez Bernstein como surge em alguma imprensa estrangeira- disse ao “Diário de Lisboa” que o desespero levou as 46 pessoas a pagar cerca de um milhão de francos franceses para escapar de França. Um valor elevado que iria ser reforçado mais tarde.

Primeiro o comandante terá exigido mais cinco mil francos ao banqueiro para assegurar que o navio se dirigiria a Lisboa e não outro qualquer porto. Já na capital portuguesa – e perante a demora na chegada dos vistos - voltariam a ser feitas exigências: mais 1150 dólares e a partir de 28 de Junho a extorsão agravou-se com a exigência de uma diária de 150 dólares por passageiro.

Na reportagem do jornal português as condições em que viviam os refugiados é classificada como sendo “pior que numa antiga terceira classe de emigrantes”: “Como ali não há sala de jantar os passageiros vêem-se na necessidade de comer sentados no chão (…). Todos trazem o seu talher na algibeira e, apesar de já terem partido há mais de um mês de Cette, conservam ainda os mesmos vestuários”.

Dias depois seria a vez do capitão e do armador do Dora relatarem a sua versão dos acontecimentos. O “capitão Fostinis” e o “senhor Atychidés” asseguraram que a mudança de rota aconteceu a pedido dos passageiros e que as exigência monetárias posteriores tiveram apenas a ver com despesas normais de um frete que se prolongava para além do tempo combinado.

Duas versões contraditórias que encontraram também lugar na imprensa estrangeira. A primeira mereceu especial atenção nos jornais da comunidade judaica que considerava o capitão do navio um “gangster”.


Um refúgio em Caxias

O caso do Dora também foi seguido de perto pela PVDE e pelo comandante do porto de Lisboa. A situação das 46 pessoas degradava-se de forma assinalável e por razões humanitárias as autoridades portuguesas autorizaram o internamento numa casa de saúde de uma criança – filha do banqueiro Bernstein – e uma outra passageira foi autorizada a ter uma consulta de odontologia.

Jornal "The Jewish Post", de 9 de Agosto de 1940.

Na primeira semana de Agosto a situação a bordo tornava-se insustentável. Após forte pressão de agências de apoio aos judeus refugiados, e com o processo para a obtenção de vistos a prolongar-se foi tomada a decisão de permitir a saída dos passageiros, mas estes teriam de ficar “internados” no forte de Caxias até que se desenrolasse o emaranhado da burocracia. Passageiros, bagagens e até alguns carros abandonaram finalmente o navio depois de cerca de um mês fechados num casco de metal.

Contam jornais estrangeiros que alguns marinheiros portugueses presentes no desembarque não esconderam as lágrimas quando viram o estado em que as pessoas se encontravam, especialmente as crianças.

O comité de apoio aos refugiados prometeu processar o capitão e o armador pela forma desumana como tratou os passageiros.

É após essa decisão que a carta anónima é enviada para Oliveira Salazar. Tudo indica que este a reencaminhou para a Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, a antecessora da PIDE, responsável pelo controlo de estrangeiros.

A resposta às acusações é feita na própria carta em diversas linhas manuscritas. A assinatura é ilegível, mas certamente será de algum responsável da polícia. Assegura-se que as acusações são falsas e que o internamento em Caxias teve com objectivo proteger os refugiados e "evitar as especulações que com eles se estavam fazendo".

Vários passageiros conseguiram nos dias seguintes vistos para Shangai ou para a Austrália, mas com as voltas que a guerra deu não é fácil perceber onde terminou a viagem destas 46 pessoas.

Carlos Guerreiro

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Prisioneiros de Guerra em Conferência Internacional

“Prisioneiros de Guerra durante o Século XX”, é o tema de uma conferência internacional que tem lugar em Lisboa, na faculdade de Ciências Sociais e Humanas, nos dias 24 e 25 de Novembro.

A iniciativa, que junta vários especialistas internacionais, vai olhar com especial atenção para as primeira e segunda guerras mundiais, mas vai também trazer o resultado de estudos de outros conflitos noutros teatros de operações.

Sobre a mesa, durante os dois dias, vão estar temas como as experiências dos prisioneiros portugueses durante a I Guerra Mundial; as experiências italiana, alemã, russa, africana e asiática durante a II Guerra Mundial; os campos de prisioneiros, a sua memória e violência; a desumanização do inimigo; a paz e o repatriamento.

Temas que darão certamente que falar.

Para saber mais pode consultar o programa AQUI.

Carlos Guerreiro

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Livro...
"Vilar Formoso - Fronteira da Paz"
de Margarida de Magalhães Ramalho

O novo livro de Margarida de Magalhães Ramalho, “Vilar Formoso - Fronteira da Paz” é apresentado sexta-feira, às 18 horas, na sala do Arquivo dos Paços do Concelho da Câmara Municipal de Lisboa.


Lisboa é o local escolhido para o lançamento deste trabalho porque para muitos dos refugiados da II Guerra Mundial – um grande número deles entrados através de Vilar Formoso - a capital representava a porta de saída para uma nova vida.

O livro surge na sequência de um projecto iniciado em 2012, pela Câmara Municipal de Almeida, que quer inaugurar, em 2016, um pólo museológico dedicado aos refugiados, com o nome «Vilar Formoso - Fronteira da Paz».

A investigação, feita no âmbito deste projeto, acabou por servir de base à publicação – com o mesmo nome que o futuro museu – e apresenta documentação e testemunhos inéditos.

A obra está dividida em sete capítulos - Gente como nós; O Início do Pesadelo; A Viage; Vilar Formoso - Fronteira da Paz; Por Terras de Portugal e A Partida. Os mesmos temas poderão ser encontrados, no futuro, nos núcleos do museu.

Por Portugal passaram milhares de pessoas em fuga. Tratava-se, na maior parte, de gente anónima, mas também aqui estiveram escritores ilustres, cineastas, pintores, artistas de cinema, intelectuais, políticos, famílias reais, banqueiros, agentes secretos, entre outros.

Alguns dos que chegaram a Portugal, nessa altura, acabaram por relatar, nas suas memórias, essa experiência. Foi o caso, nomeadamente, de Arthur Koestler, Alfred Döblin, Heinrich Mann, Antoine de Saint – Exupéry, Erika Mann, George Rony e Peggy Guggenheim.

Trata-se de mais um mergulho na história recente do país, numa altura em que nos aproximamos da passagem dos 65 anos do fim da II Guerra Mundial.

Carlos Guerreiro

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Livros...
Dois Hotéis em Lisboa

A vida em Lisboa e na linha do Estoril, durante o ano de 1940, é tema para mais um livro, agora de ficção, saído das mãos de David Leavitt.

“Dois Hoteis em Lisboa” foi considerado um dos livros notáveis de 2013 pelos editores do “New York Times Book Review”, na categoria de ficção e poesia.

Leavitt é um autor consagrado, com vários romances e contos publicados, e vários estão traduzidos para português.

Fica a sinopse:

Dois casais de forasteiros travam conhecimento na lisboeta e cosmopolita pastelaria Suíça. Estamos no ano de 1940, em plena Segunda Guerra Mundial, e Lisboa fervilha com milhares de refugiados, que esperam pelo visto e pela possibilidade de viagem para a América, com espiões e membros da nobreza europeia.

Pete e Julia Winters são expatriados americanos burgueses que viviam em Paris; Edward e Iris Freleng são americanos também, mas mais ricos, sofisticados e boémios. Por coincidência, estão todos hospedados no Hotel Francfort, mas acabam por descobrir que afinal há dois hotéis Francfort em Lisboa.

É neste ambiente de tensão e de total insegurança, sobretudo em relação a um qualquer tipo de futuro, que a ligação entre os dois homens se desenvolve e se transforma num envolvimento amoroso.

Um romance maravilhosamente escrito, com um forte pendor sexual e político, e em que a cidade de Lisboa e a linha do Estoril têm o estatuto de personagem.

Boas Leituras.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Lisboa, arte e guerra...
Inconfidências fatais e negócios de ocasião

Quando Hugo Andriesse encontrou Georg Hoffmann nas ruas de Lisboa, em finais de 1940, deve ter pensado que encontrara a solução para recuperar a colecção de quadros que deixara escondida à guarda do Museu Nacional da Bélgica. Não podia adivinhar como estava errado...

Andriesse era um importante industrial e colecionador de obras de arte. Nascido na Holanda e radicado na Bélgica, seria um dos muitos judeus a engrossar as colunas de refugiados que chegaram a Lisboa depois do avanço alemão sobre a Bélgica e sobre a França em 1940.

"A rapariga com o Papagaio", de Caspar Netscher, é um dos quadros da colecção de Hugo Andriess que nunca foi recuperado. No Von der Heydt Museum, na cidade de Wupertal, na Alemanha, está exposta uma pintura muito semelhante, mas o facto de existirem diversas cópias tem impedido as autoridades de o reclamar.

Com mais de setenta anos a sua posição social garantiu-lhe um bilhete para a América, mas para trás deixou, protegida nos abrigos antiaéreos do Museu Nacional da Bélgica - o “Musee Cinquantenaire” -, toda a sua colecção de pinturas e outras peças artísticas.

Durante anos prometera aos responsáveis da instituição deixar-lhes alguns quadros em testamento. O museu não colocou, por isso, quaisquer dificuldades para “abrigar” as obras de arte.

Em Lisboa os seus passos cruzaram-se com os do alemão Georg Hoffmann em Outubro de 1940. Conheciam-se. Hoffmann era um dos representantes comerciais da Galeria Katz, de Paris, onde o industrial tinha adquirido parte importante das obras da sua colecção.

Andriesse terá acreditado que Hoffmann - um alemão - conseguiria recuperar o seu tesouro. Confiou-lhe um pedido de ajuda. Queria que ele resgatasse da Bélgica os quadros, as tapeçarias e os tapetes.

O alemão mostrou-se interessado em ajudar e extorquiu todas as informações que pode. Depois dirigiu-se ao Cônsul Alemão em Lisboa e fez a denúncia: o museu nacional belga guardava a colecção particular de um judeu.

Estranhamente nada aconteceu…

Mas em Agosto de 1941 Hoffmann foi preso em Berlim e, durante o interrogatório, voltou a denunciar a existência dos quadros. Garantiu que eram mais de 60, entre eles “A Jovem” De Rembrant, para além de telas de Ticiano, Salomon e Ruysdael.

Mostrou-se também disponível para ajudar na sua identificação, pois conhecia-as do tempo em que negociara com Andriesse na Katz, em Paris. Assegurava também que o chauffeur do empresário - que conhecia apenas como Jean – ajudara a esconder a colecção e, com “um incentivo financeiro”, não teria problemas em dar uma ajuda na sua recuperação.

Em Outubro os alemães começaram a interrogar e a pressionar os responsáveis do Musee Cinquantenaire. Estes agarravam-se às promessas Andriesse. Se após a morte do empresário iriam herdar as pinturas eram legítimos proprietários do estava encerrado nos seus abrigos antiaéreos.

De pouco serviram as questões levantadas. O chauffeur ajudou a identificar as caixas que pertenciam ao ex-patrão e a meio de Dezembro foi tudo confiscado pela Unidade Especial Rosenberg (Einsatzstab Reichsleiter Rosenberg ou ERR) encarregada por Hitler de cuidar das questões culturais da Alemanha.

Esta unidade especial seria responsável pelas maiores pilhagens da guerra, devidamente registadas e catalogadas. Num documento de 1944, encontrado mais tarde pelos americanos, a ERR assegurava orgulhosamente, ter “salvo para a Europa” quase 30 mil peças de arte entre quadros, esculturas, tapeçarias, pratas, ouros, loiças, livros e muito mais. Parte deste saque nunca seria recuperado…

A colecção de Andriesse era constituída por cinco tapeçarias e 17 tapetes orientais antigos, para além de 28 quadros encerrados em caixas especiais. Entre estes encontravam-se, para além dos autores já referidos, também um Netscher, um Goyen e um Cuyp.

Andriesse viria a morrer em Nova Iorque, em 1942 e não voltaria a ver os seus quadros. Depois da guerra o Museu Cinquantenaire e familiares deram início ao processo de recuperação das obras de artes. Setenta anos passados, algumas nunca reapareceram.


Na arte do negócio

Há poucas certezas sobre a quantidade e a qualidade das obras de arte que circularam pelo país durante a guerra, até porque, como se viu, era importante manter a discrição para evitar o apetite dos nazis e dos seus protegidos.

Pela capital portuguesa circularam centenas, senão milhares, de pinturas, esculturas e outras peças artísticas. Para muitos refugiados, equivaliam a um seguro, uma garantia de dinheiro rápido em caso de emergência, razão porque encontravam facilmente lugar na bagagem, mesmo quando esta era de magro porte.

Talvez por isso podiam-se encontrar, em Março de 1942, diversos quadros de Hooch, Brueghel, Van Goyen, Tiepolo Diaz, Troyon, Whistler, Potter e Liebermann nas mãos da empresa Eco Trading, sedeada em Lisboa.

A informação - contida num relatório do Ministério dos Negócios Estrangeiros Britânico, elaborado em Abril de 1945 - adianta que a companhia justificou a propriedade com a aquisição de algumas pinturas em “leilões e lojas de antiguidades de Lisboa”, enquanto outras pertenciam ao refugiado judeu alemão, Wilhelm Artmann, um dos milhares que tinham chegado a Portugal após a invasão da França.

Negociante de arte comprara os Liebermann em Berlim quando Hitler mandara retirar de todas as galerias públicas os trabalhos de artistas judeus. Outros sete quadros tinham sido comprados no Luxemburgo e mais quatro ou cinco já em Lisboa.

Ainda em Portugal, um outro refugiado chamado Adolph Weiss tinha à venda um conjunto de tapeçarias e um tríptico. Fora cônsul de Portugal em Viena, na Áustria, durante 25 anos, mas por ser judeu tivera de fugir depois da anexação do seu país, estabelecendo-se no Estoril.

Assegurava que as obras lhe tinham sido entregues pelo Arquiduque Frederico da Áustria em pagamento de uma dívida. As autoridades britânicas e americanas suspeitavam, no entanto, que estas eram pilhadas, facto que “talvez” Weiss desconhecesse.

Em 1944, o ex-cônsul propôs ao Governo de Salazar a compra das sete tapeçarias. Retratavam a “história de Esther” e teriam sido oferta de casamento da rainha francesa Maria Antonieta à Irmã, Maria Cristina, no século XVIII.

O Governo português não se terá interessado pela proposta e o mesmo aconteceu, mais tarde, com o Governo britânico. O tríptico foi oferecido a uma galeria britânica, mas também aqui se gorou o negócio.

A única proposta concreta para a aquisição das tapeçarias terá vindo do Governo de Vichy, que terá adiantado 55 milhões de Francos pelas tapeçarias, mas estas nunca lhe chegaram às mãos.

O intermediário neste negócio era Antonio Pacetti, uma das muitas figuras intrigantes que passaram por Lisboa. Era suspeito de ser um agente do eixo envolvido no tráfico de obras de arte, e, em 1945, vivia na Suíça, enquanto estava sob investigações dos vencedores da guerra.

Curiosamente Pacetti apresentava-se, no pós-guerra, como vendedor das tapecçarias, não sendo claro se o fazia em nome pessoal ou em representação de Weiss, pois ambos – aparentemente - se diziam donos das peças e, tanto um como outro, procuravam clientes americanos para vender as vender por muitos “milhões de dólares”.

Carlos Guerreiro

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Livros
“Última Noite em Lisboa” de Sérgio Luís de Carvalho

É mais um novo livro de ficção sobre o Portugal da II Guerra Mundial. Segunda as notícias que vão surgindo em noticiário especializado da indústria livreira ele será lançado no próximo dia 19 de Fevereiro.

Ficaremos à espera.


Até lá, fica a sinopse oficial do livro de Sérgio Luís de Carvalho:

«A II Guerra Mundial vai no seu quarto ano. Numa Lisboa pobre, pacata e marialva, apenas os refugiados, as manobras militares da Legião Portuguesa e as filas que se começam a fazer à porta das lojas denunciam a existência de um distante e sangrento conflito.

Henrique é um jornalista que trabalha na revista A Esfera*, subsidiada pelos serviços secretos nazis, quando conhece a nova vizinha do lado, Charlotte, uma refugiada austríaca, cuja liberdade e antinazismo lhe vão abrir novas perspetivas.

Cada vez mais, Henrique sente-se entre dois mundos antagónicos. De dia, trabalha entre convictos nazis; à noite, está com Charlotte e com Maria Carolina.

O que Henrique desconhecia é que os segredos e os mistérios da vida de Charlotte implicariam uma escolha dramática para os seus destinos.

* Embora se tivesse mantido imparcial durante a II Guerra Mundial, o regime salazarista mantinha uma clara preferência. Provam-no os obstáculos à entrada de refugiados no país, sobretudo de origem judaica, e a autorização de publicações que assumiam o seu apoio aos países do Eixo. A revista A Esfera era uma dessas publicações.»

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Viana dos Santos, comerciante quase espião

“Não faz ideia de como estou bem de saúde. Podia dizer isto para animar mas não. È verdade, sinceramente sinto-me com bastante saúde e só penso em vocês aí como se hão-de governar sem o meu auxílio”. Artur Viana dos Santos escrevia assim à mãe em 12 de Janeiro de 1943, poucos dias depois de ser detido na África do Sul acusado de espionagem a favor dos alemães.

Artur Viana dos Santos realizou a sua viagem de "espionagem" no paquete "Angola", da Companhia Nacional de Navegação.

Na carta assegurava à mãe que as acusações não faziam sentido. “(…) Tenho fé de em que as autoridades reconhecerão que nada de mal lhes fiz, nem farei, o que seria um crime para a minha consciência e acabarão por me pôr em liberdade e então hei-de novamente recomeçar a ganhar dinheiro para as manter e voltaremos à nossa vida normal”.

Apesar das garantias à família, Artur Viana dos Santos estava de facto envolvido numa rede de espionagem alemã que tinha como centro a cidade de Lisboa. A troco de dinheiro deveria fornecer informações sobre o movimento de navios e de tropas aliadas.

As informações seriam recolhidas durante a viagem entre Lisboa e Lourenço Marques no paquete “Angola”. Entre o embarque, a 30 de Novembro de 1942, e a chegada, programada para 29 de Dezembro, o navio passava por Leixões, Funchal, Luanda (Angola) e Cidade do Cabo (Africa do Sul) - onde foi detido - antes de aportar na capital moçambicana.

O dossier coligido pelos serviços secretos ingleses refere que as actividades de Viana dos Santos foram descobertas através de informações “de uma fonte muito secreta”, o que normalmente significa que se tratou de uma intercepção feita pelos descodificadores de Bleetchley Park, o mais secreto dos serviços da II Guerra Mundial.

Para além desta nota existe também uma biografia detalhada e o resultado de diversos interrogatórios. O português relembra como foi recrutado, pormenoriza a lista de agentes alemães que contactou, as instruções que recebeu para enviar cartas com tinta invisível e os detalhes do código que deveria ser utilizado nos telegramas que seguiriam para Lisboa com as informações recolhidas durante a viagem e a estadia em Moçambique.


Treino para espião

Nascido em 1908, Artur Viana dos Santos começou a trabalhar aos 12 anos, passando por vários empregos, para sustentar a mãe e a irmã. Pouco antes da guerra foi o pequeno comércio a sustentar a família que passou também a incluir uma noiva.

Apesar de algum sucesso nunca conseguiu viver de forma desafogada e a proposta de uma viagem de negócios pelas colónias portuguesas de então terá parecido uma excelente ideia para dar a volta à vida.

A sugestão da viagem foi feita por Eduardo Caldeira, um amigo que conhecera no final dos anos 20 quando ambos integraram a Liga 28 de Maio. Este garantiu a Viana dos Santos que não seria difícil encontrar um financiador que assumisse as despesas.

Caldeira era um conhecido colaborador dos serviços secretos alemães, integrando uma rede de espionagem liderada pelos alemães Bergner, pai e filho, que tinham um negócio em Lisboa e coordenavam uma rede ligada às informações navais.

A proposta foi feita em Julho de 42 e logo nesse mês Artur foi apresentado aos Bergner. Os alemães pagavam as despesas da viagem e em troca o português enviaria toda a informação sobre a presença de navios e o movimento de tropas aliadas que conseguisse recolher ao longo do percurso. Havia um interesse especial sobre o que se passava na África do Sul e em Madagáscar.

Em Setembro começou a ser instruído sobre a utilização de dois códigos, inventados por Bergner filho, que deveriam ser utilizados nas mensagens enviadas por telegrama. A complexidade de ambos é tão grande que os especialistas britânicos os consideraram impraticáveis.

Dois dias antes de partir recebeu também aulas sobre a utilização de tinta invisível. Uma mistura de limão e alúmen que seria aplicada no papel com um palito de madeira ou um cotonete. As cartas seriam enviadas para a Rua dos Remédios, 185, de Lisboa, sede da empresa Rodrigues & Viana, criada por Rodrigues Caldeira e Artur Viana para dar cobertura à viagem.

Viana dos Santos tornou-se também representante da Comércio, Exportadora e Importadora Lda.. Para dar maior legitimidade ao périplo colocou também anúncios em jornais oferecendo os seus préstimos como viajante, angariando a representação de outras empresas mais pequenas e também de particulares.

Os alemães começaram logo a pagar-lhe em Lisboa as horas que despendia na aprendizagem e ainda em alguns serviços de vigilância no porto de Lisboa, nomeadamente, no controlo de chegada e partida de navios aliados.

No total terá recebido entre 6 e 8 mil escudos (30 a 40 Euros) em Lisboa e ficou também combinado que a mãe receberia mil escudos (5 Euros) por mês enquanto estivesse em viagem.


Um espião inadequado

Aos interrogadores ingleses garantiu que, apesar de ter assumido a realização dos relatórios, nunca teve intenção de fazer realmente espionagem. Apenas as promessas de dinheiro o mantiveram ligado aos Bergner e, de facto, não foram encontradas quaisquer provas de tivesse sido enviado algum tipo de relatório durante as semanas de viagem.

Também não foram encontrados os livros com os complicados códigos que deveria utilizar, mas Viana dos Santos disse nunca os ter transportado. Estes seguiriam no navio com um membro da tripulação, que ele não conhecia, e só lhe seriam entregues à chegada a Moçambique.

No relatório os interrogadores britânicos salientam que o caso Viana dos Santos é “sórdido” e que se trata de um exemplo do “faro habitual” dos serviços secretos alemães para alistar “agentes inapropriados”. Consideram também que pelas suas características, formação e material transportado seria sempre um espião de baixa categoria.

Apesar destas constatações salienta “que seria um erro sugerir que ele não poderia ser perigoso”.”Trata-se de um mau carácter e enquanto os pagamentos fossem suficientes ele continuaria a actuar para os serviços secretos alemães sem escrúpulos”, conclui.

Depois de retirado do “Angola” Viana dos Santos passou vários meses nos campos de prisioneiros sul-africanos de Jagersfoentein e de Koffiefontein. Foi do primeiro campo que enviou a carta á mãe onde escrevia também que estava um “bocado queimado como se estivesse numa praia”, que já tinha “jogado dois jogos de futebol” e que ali lhe faltava apenas “trabalho e liberdade para ir embora”.

Nos meses seguintes esse estado espirito iria alterar-se. Em Setembro de 1943 foi transferido para Inglaterra e internado no campo 020, reservado aos acusados de espionagem.

Interrogado de novo parece que a sua situação psicológica de Viana dos Santos se alterou e tentado, pelo menos duas vezes, o suicídio.

Seria libertado com outros agentes portugueses ao serviço dos alemães, internados no campo 020, durante o ano de 1946.

Carlos Guerreiro

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Lisboa, cruzamento da vida dos Gerassi

Há cerca de 70 anos, mais precisamente no dia 11 de Novembro de 1943, casavam em Lisboa Helen e Alfred, um casal nascido das coincidências que as guerras sempre encontram para  - além de histórias de morte e de sofrimento - também poder contar histórias de vida.

Tanto um como outro trabalharam para a espionagem britânica ao longo da guerra. Ela fugiu de França em 1940, com rumo incerto, para acabar a trabalhar na Embaixada Britânica em Lisboa.

O casal Gerassi em finais dos anos 40.
(Foto: Patrick Gerassi)
Ele começou por fazer o caminho inverso. Cidadão francês ofereceu-se aos ingleses em Lisboa e partiu para França onde colaborou na organização de uma linha de fuga que terminava em Portugal transportando refugiados, agentes e pilotos aliados abatidos. Foi preso pelos nazis e pela PVDE (antecessora da PIDE), mas saiu sempre ileso.

As histórias de Helen Girvin Balfour e Alfred Gerassi e do seu encontro em Lisboa têm ocupado desde há muito o filho, Patrick, que conseguiu ao longo dos anos reconstituir a vida dos pais durante a 2ª guerra.


Preso duas vezes

O francês Alfred Gerassi ofereceu-se, em Lisboa, para trabalhar com os ingleses em Março de 1941.

Natural de Paris foi enviado para a sua cidade natal com o objectivo de estabelecer uma rota de fuga que permitisse retirar da França ocupada não só refugiados importantes, mas também agentes secretos e pilotos aliados cujos aparelhos tivessem sido abatidos.

As suas actividades tornaram-no suspeito aos olhos dos alemães e a Gestapo deteve-o em Março do ano seguinte. Não teriam muitas provas contra ele e, mantendo o sangue-frio, não conseguiram que fizesse qualquer confissão.

Em Maio foi libertado pelos alemães e voltou às suas actividades, mas agora em Lyon. Regressou a Lisboa em Novembro, mas não ficou parado.

Os serviços secretos britânicos encarregaram-no de organizar uma nova rota de fuga. Esta estendia-se desde a França, passava por Bilbao, em Espanha, e terminava em Lisboa.

Alfred e Helen Gerassi em Lisboa em 1944.
(Foto Patrick Gerassi)
As suas movimentações alertaram a PVDE que também o deteve. Durante nove semanas, em 1944, esteve preso e foi interrogado.

Segundo a nota de recomendação da Medalha de Coragem ao Serviço da Paz, que lhe foi entregue no final da Guerra pelo Rei de Inglaterra, Gerassi voltou a não fazer qualquer denúncia ou confissão.

A documentação recolhida pelo filho assegura que as rotas de fuga criadas por Alfred serviram para fazer sair de França diversos agentes importantes e pessoal da RAF.

Mesmo enquanto esteve detido pela PVDE a rede não cessou a sua actividade até porque da embaixada chegava, como visitante, Helen Girvin Balfour que também era sua mulher…


Uma mulher decidida

Helen foi apanhada em França, onde vivia desde 1929, pela guerra e pela chegada inesperada das forças alemãs em 1940.

Como milhares de outras pessoas rumou primeiro à fronteira franco-espanhola e, sozinha, conseguiu atravessar o país vizinho de comboio, na esperança de chegar a Lisboa e dali partir para o seu país natal, o Reino Unido.

Na fronteira com Portugal um Guardia-Civil ficou-lhe com as economias em troca do direito de passagem para terras lusas. Conseguiu, mesmo assim, chegar ao Porto onde, sem dinheiro, bateu à porta do consulado britânico.

Ficou primeiro espantada e depois desesperada quando o cônsul não lhe oferece qualquer ajuda ou solução para o seu futuro imediato.

Em lágrimas percorre sem rumo algumas ruas do Porto. Não tem dinheiro e não sabe o que fazer a seguir. Para sua surpresa depara-se com dois homens que leem, na rua, o jornal inglês “The Daily Telegraph”.

Aborda-os e conta-lhes as suas últimas desventuras.

Boletim de lactente do filho mais velho do casal Gerassi.
(Foto: Patrick Gerassi)


Os leitores do jornal eram espanhóis, de Jeres, e trabalhavam em Vila Nova de Gaia, nas Caves de Gonzáles Byas. Num inglês quase perfeito prometem ajudar Helen e colocam-na rapidamente num comboio com destino a Lisboa.

Na capital portuguesa consegue reorganizar a vida e começa até a trabalhar na Embaixada Britânica…

Meses mais tarde o consul de Porto deslocou-se a Lisboa e ficou surpreendido por a ver a trabalhar na Embaixada. Preocupado disse-lhe que o deveria ter "avisado" que era conhecida do Embaixador...

Em Maio de 1943 Helen foi uma das últimas pessoas a encontrar-se em Portugal com o actor Leslie Howard, quando este esteve no nosso país para um conjunto de conferências.

Helen era ainda prima do actor que foi um dos protagonista do filme "E tudo o Vento Levou".

No dia 1 de Junho de 1943 Leslie levantou voo do Aeroporto da Portela no Voo777 com destino ao Reino Unido. Treze passageiros e quatro tripulantes desapareceram quando o avião foi abatido pela força Aérea Alemã sobre a Baía da Biscaia.

Foi também em Lisboa que casou com Alfred, em Novembro de 1943, e foi também ali que lhes nasceu o primeiro filho, Jean-Michel ou Juan Miguel, em Fevereiro do ano seguinte.


À procura de respostas

Desde há muito que outro filho do casal, Patrick Gerassi, tenta reconstituir os passos dos pais durante o conturbado período da 2ª guerra Mundial.

Jornalista da BBC foi desenhando, entre documentos, fotografias e memórias, uma imagem cada vez mais clara do que aconteceu no mundo de intrigas onde estes se movimentaram.

Helen com Manuel González Díez, um dos irmãos que a ajudou a chegar a Lisboa depois de muitos contratempos.
(Foto: Patrick Gerassi)
Em Fevereiro deste ano conseguiu dar mais um passo. Tinha a foto de um dos homens que ajudara a mãe quando ela chegara desamparada ao Porto. Como sabia que eles eram de Jerez, enviou a imagem para um jornal dessa cidade andaluza na esperança de que alguém o conseguisse identificar.

Os arquivos da casa Byas trouxeram a resposta.

Tratava-se de Manuel González Díez, filho de um marquês andaluz, que durante duas décadas geriu as caves Byas no Porto.

Apesar de ter falecido em 1991, a esposa ainda é viva. Razão suficiente para Patrick – que neste momento vive na Galiza – se meter à estrada com a esperança de descobrir um pouco mais da sua história…

Carlos Guerreiro

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Livros...
Espiões em Portugal durante a II Guerra Mundial

A espionagem em Portugal durante a 2ª Guerra Mundial é o tema central do novo livro de Irene Pimentel que, para completar estas cerca de 400 páginas, consultou arquivos britânicos, americanos, alemães e portugueses.

O resultado desse trabalho é apresentado esta tarde em Lisboa, por volta das 18.30 horas, na Fnac do Chiado.

Esta nova obra “Espiões em Portugal durante a II Guerra Mundial” percorre – como a autora própria reconhece - um caminho já muito explorado por outros livros e autores que nas últimas décadas têm investigado este tema, mas o assunto da espionagem é, e continuará a ser, inesgotável.

Todos os dias surgem novas fontes e novos dados que individualmente ou cruzados com material já existente ajudam a redescobrir histórias ou a reescrevê-las.


Por Lisboa, a capital neutral de uma Europa em guerra, passaram muitas personalidades que renasceram no pós-guerra como personagens de ficção, tão fantásticas e inacreditáveis tinham sido as suas aventuras.

Encaixam perfeitamente nesta descrição os agentes duplos Trycicle ou Garbo, elementos fundamentais de um logro montado pelos britânicos que desviaram as atenções das praias da Normandia no Dia D. Tanto um como outro não só passaram por Lisboa, como a cidade foi um importante centro para as suas actividades.

É com a história da operação “Fortitude”, que envolveu os dois agentes já referidos, que o novo livro de Irene Pimentel arranca. Dessas primeiras páginas seguimos depois por outros caminhos.

Um resumo dos vários capítulos é apresentado logo no prefácio.

É esse resumo que aqui fica:

“O capítulo I, de apresentação das principais redes de espionagem e de Informação, britânicas e alemãs, aborda assim o período desde os anos trinta e 1940, com uma caracterização do regime salazarista, bem como breves referências à tentativa de internacionalização do fascismo e do nacional-socialismo em Portugal, o início da II Guerra Mundial e a neutralidade portuguesa. Segue-se o capítulo II, que cobre os anos de 1940 e 1941, este último o «de toda» a colaboração luso-alemã, tratando do início da actuação em Portugal das redes de propaganda e espionagem dos dois campos beligerantes, Inglaterra e Alemanha, respectivamente, o SIS/MI6, no primeiro caso, e a Abwehr e a Gestapo-SD, no último caso.

É ainda referida a actuação da Legião Portuguesa, questionando se esta era a rede de Intelligence e de contra-espionagem portuguesa.

O capítulo III trata da actuação em Portugal, em 1941 e 1942, das redes britânicas MI 9 e SOE-rede Shell, bem como o relacionamento desta última com a LP, por um lado, e das redes da Abwehr e da Gestapo/SD em solo português, nomeadamente, bem como o relacionamento destas últimas com a PVDE. Segue-se o capítulo IV, que aborda o ano de 1942, difícil para o relacionamento luso-britânico, devido ao desmantelamento da rede Shell, num período em que, do lado alemão, então com preponderância e maior liberdade de actuação, a Abwehr lança campanhas de desinformação contra os britânicos e denuncia as suas organização à PVDE.

São ainda referidas a resistência e colaboração de refugiados, judeus portugueses e comunistas alemães com as redes aliadas, em particular com a francesa e soviética. O capítulo V, sai um pouco da cronologia, pois ocupa-se da actuação dos serviços secretos franceses e norte-americano em Portugal, num período mais alargado entre os anos 40, em particular entre 1942 e 1944.

A segunda parte do livro cobre o período entre 1943 e 1945. No capítulo VI, «A caminho da vitória aliada», é tratada a reacção e retaliação dos britânicos contra o desmantelamento das suas redes, em 1941 e 1942, denunciando, por seu turno, as alemãs, actuantes em solo português. Este capítulo, cujo arco temporal é sobretudo o ano de 1943, “sai” de Portugal continental, fazendo incursões geográficas pelos Açores e por outras locais não-europeus de África e da Índia, sob administração portuguesa, nomeadamente por Moçambique e Mormugão.

Termina com uma análise de Lisboa enquanto plataforma de negociações entre personalidades do Eixo, com os Aliados ocidentais, com vista à assinatura de uma paz unilateral com estes. O capítulo VII dá conta, em 1943 e 1944, do conhecimento e desmantelamento, em Portugal, com a ajuda dos britânicos, das quatro redes alemãs, da Abwehr e da Gestapo. Segue-se o capítulo VIII, sobre os espiões duplos do Double Cross (XX) Committee, de «Snow» - o primeiro espião duplo dos britânicos - a «Garbo» e «Tricycle», passando por «Zig Zag» e «Artist», que actuaram em Portugal e tiveram um papel importantíssimo no apoio ao desembarque aliado na Normandia, em Junho de 1944.

Finalmente, o capítulo IX aborda os últimos dois anos da guerra, 1944 e 1945, analisando questões como o embargo do volfrâmio pelo governo português, o trágico rapto de Jebsen («Artist»), bem como o encarceramento deste último e da jornalista alemã Pedtra Vermehren em campos de concentração alemães, onde o primeiro acabaria por ser assassinado.

Num período em que a Abwehr, com a queda em desgraça do almirante Canaris, é integrada na estrutura da Gestapo-SD, apenas esta ainda opera em Portugal, mas os seus elementos, bem como os seus cúmplices portugueses são expulso e presos pelo governo salazarista, quando no horizonte se vê o final da guerra, marcada pela derrota dos nazi-fascistas. No final da guerra, é tempo de os serviços secretos britânicos e norte-americanos, cujo destino é brevemente apontado, interrogarem os espiões alemães, presos, e conhecer a composição das suas redes.

O livro termina com um «Epílogo, onde se inclui a vitória aliada e o fim do SD em Portugal, e é abordado um episódio, já na guerra-fria, que remete para a alegada actuação de redes comunistas durante a II Guerra Mundial e revela a hegemonia mundial do mundo ocidental pelos EUA, acertando baterias contra o novo inimigo – a União Soviética.”

Boas leituras

Carlos Guerreiro

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Turistas descobrem Lisboa da 2ª Guerra

A Lisboa da 2ª Guerra Mundial é agora destino para turistas britânicos, uma iniciativa que envolve o autor Neil Lochery e os hóteis do grupo Tivoli.

A “Lisbon WWII Tour” terá como guia o próprio Neil Lochery que durante dois dias vai acompanhar os grupos de turistas por vários locais que assumiram especial importância durante o período da guerra.

 O objectivo é trazer grupos de até 20 pessoas a Lisboa.

O programa, que ronda os 800 Euros por pessoa, incluí a dormida, a alimentação e passeios por Sintra e por Lisboa, com paragens na Gulbenkian, Belém e Mosteiro dos Jerónimos.

No pacote está ainda incluída – como não podia deixar de ser - uma noite de fados.

Neil Lochery é autor do livro “Lisboa, A guerra nas Sombras da Cidade da Luz”, editado o ano passado pela “Presença” e onde é feito um retrato da capital portuguesa durante o período da guerra.

O autor já tinha promovido, em Lisboa, também uma exposição de fotografias com as imagens da Lisboa dos anos 40 que o tinham impressionado.

Mais informações podem ser obtidas no site autor que se encontra AQUI.

Carlos Guerreiro

quarta-feira, 8 de maio de 2013

A Vitória na festa do “Reviralho”

“Viseu acaba de assistir a uma manifestação demo-comunista, em que se verificaram aspectos de tal forma graves que a cidade ficou e anda justamente alarmada”. As primeiras linhas do relatório do comando da Legião daquela cidade nortenha não deixam dúvidas sobre as preocupações deixadas pelos festejos da vitória aliada.

Festejos em Lisboa frente à Embaixada Inglesa.
(Revista "Mundo Gráfico", 15 de Maio de 1945 /Hemeroteca de Lisboa)
A vitória das democracias e da Rússia comunista na guerra fazem os homens da “situação” temer o pior tanto ali, com o noutras cidades portuguesas. Receia-se um golpe de estado, apoiado por britânicos ou americanos, e forma como as multidões acorreram aos festejos não descansam ninguém.

Mal a notícia da rendição se torna pública, na tarde do dia 7 de Maio, as ruas foram ocupadas nas cidades, vilas e aldeias de todo o país.

Há foguetes e “morteiradas”. Bandas e fanfarras saíram à rua por conta própria ou solicitadas por comissões formadas para liderar os festejos, algumas destas últimas sob forte suspeita do regime.

Não existe uma política comum a todo o país para controlar as diferentes manifestações. Em alguns concelhos tudo se autoriza, enquanto noutros, são colocados limites.

Em Portalegre, por exemplo, o presidente da câmara não autorizou saída da banda “por haver fundado receio de que o facto fosse aproveitado para exteriorização de ideias subversivas ou contrárias à actual situação política”.

De um modo geral, no dia 7, as festas são mais espontâneas, tem um carácter mais popular e prolongam-se pela noite com muitos “vivas” e “atrás dos vivas, começaram de notar-se as bebedeiras que se prolongaram pela noite fora.” Para o dia seguinte marca-se nova festa e manifestação, especialmente, nas localidades de maior dimensão e, neste caso, já se nota uma certa organização tanto por parte dos que celebravam como por parte das autoridades.


O medo da vitória aliada 

O medo das consequências de uma derrota das forças fascistas da Europa são notórios em vários relatórios que foram chegando ao Ministério do Interior, especialmente, durante os anos de 1944 e 1945.

Festejos no Porto
("Jornal de Notícias", 8 de Maio de 1945 /Hemeroteca de Lisboa)

“Depois dos últimos acontecimentos da guerra (a morte afrontosa de Mussolini e a tomada de Berlim pelas tropas Russas) notava-se em certos sectores, uma excessiva alegria, onde afloravam ódios mal contidos, rancores pessoais e esperanças de uma subversão política em Portugal”, explica o já mencionado relatório de Viseu e não é caso único.

“Os conhecidos agitadores do Entroncamento (…) andam de orelhas levantadas e bastante animados. Juntam-se em grupos discutindo os acontecimentos. (…) Os homens da Situação andam amedrontados e rendem finezas aos adversários. Diz-se que finda a guerra há modificação do Governo. Que os aliados impõem aos outros povos a forma de Governo (democracia)”, resume um outro relatório da PSP de Setembro de 1944.

No mesmo documento pode ainda ler-se que muitos responsáveis locais “estão aterrorizados, o que demonstra bem claramente, porque contando talvez com qualquer revês, pactuam com pessoas reconhecidamente adversárias da situação".

Com o aproximar do fim surgem cada dados cada vez mais alarmantes sobre uma potencial ameaça ao Estado Novo.

“Silvino Diogo (…) disse a alguém que possuía em sua casa uma “lista negra”, que lhe fora fornecida pelos americanos, na qual constam os nomes de pessoas da Situação e Legionários que haviam de ser abatidos”, revela um dos muitos relatórios dos Serviços de Vigilância da Legião Portuguesa de Lisboa, datado do dia 7 de Maio.

Portugal vibrou de emoção, diz a legenda desta fotografia.
(Revista "Vida Mundial Ilustrada", 17 de Maio de 1945 /Hemeroteca de Lisboa)

Noutra informação da Legião, com data de 5, é destacada a confiança de um certo Medeiros, que em pleno Salão Brasil, na Rua Augusta, em Lisboa, se permitiu “fazer várias afirmações vexatórias (…) comentando o facto da Bandeira Nacional estar a meia haste em sinal de luto pela morte de Hitler. Assim, em voz alta, dizendo não ter receio daquilo que lhe fizessem, insultou o senhor Presidente do Conselho, tratando-o de «filho da puta», bem como todos os componentes do exército e Legião”.

Somam-se os actos de desafio.

“Em Coimbra, na noite de 3 do corrente, foram deitados mais de 500 morteiros, com o fim de festejar a queda de Berlim. Supõem-se que tenham sido anti-situacionistas, os autores desta manifestação”, salienta um relatório da Legião enquanto outro dá nota da colocação da bandeira “vermelha com a foice e o martelo, no poste da 3ª secção da Junta de Autónoma de Estradas” de Queluz, na noite de 6 para 7, enquanto três dias depois o mesmo acontecia na Ponte de Rio Tinto, no Porto.


O "reviralho" sai à rua

É assim num país em clima de tensão que se chega à assinatura da rendição dos exércitos alemães. E se no dia 7 a maioria das manifestações teve, como já foi referido, um carácter mais popular e espontâneo, as iniciativas marcadas para o dia 8 assumem um outro nível de organização.

Não se vão registar problemas de maior, mas à frente das multidões que se juntam para ouvir discursos e para vitoriar os aliados surgem várias pesonalidades que o regime identifica como elementos do “reviralho”, “comunistas”, “democratas” ou de “ideias avançadas”.

Mesmo entre a população há medo … Em algumas zonas onde estavam marcadas concentrações para o fim do dia o comércio já não abriu as portas durante a tarde.

O olhos e os ouvidos das gentes da “situação” aguçam-se e de vários pontos do país chegam notícias. Nomeiam-se os cabecilhas, repisam-se os seus discursos, apontam-se os suspeitos mais perigosos.

“Alfredo Mendes da Silva, ex-aluno da faculdade de direito, foi quem chefiou a manifestação dos universitários, à Embaixadas Inglesa e Americana. Era este cavalheiro quem gritava «DEMOCRACIA» e «LIBERDADE», e pediu em frente da Embaixada Americana que fosse ajudada a academia para se obter em Portugal Liberdade e democracia. Este nojento individuo, sempre manifestou o seu ódio ao Estado Novo, e principalmente a Salazar. (…) Hoje, diz alto e bom som, que é russófilo”, assegura uma nota dos Serviços de Informações da Legião.

Numa outra pode ler-se que “o conhecido maestro comunista LOPES GRAÇA, e outros elementos desconhecidos foram vistos orientando várias manifestações de carácter subversivo, entre elas uma que pretendeu assaltar o Café Martinho”. Na Régua “salientaram-se, dando vivas à União Soviética e «morras» à Gestapo Portuguesa, o cauteleiro SOTERO, que apesar de analfabeto, sempre se tem mostrado hostil à situação; CLAUDINO CLEMENTE, empregado de armazém da Casa do Douro; MANUEL PAIXÃO, taberneiro; ANGELO MONTEIRO, mestre-de-obras”.

Festa em Lisboa .
(Revista "Mundo Gráfico", 15 de Maio de 1945 /Hemeroteca de Lisboa)

Para além de se apontarem nomes também se enumeram os desafios ao regime, mesmo quando não possível apontar culpados. No Crato não houve desordens, mas ouviram-se frequentemente, “vivas à Rússia e à Liberdade, percebendo-se o espírito tendencioso da parte das pessoas que os soltavam (…). É certo que concorreu para tanto, a generosidades de dois proprietários de estabelecimentos de bebidas que, na boa intenção de comemorarem o fausto acontecimento, ofereceram vinho ao povo”.

Em Campo Maior foi possível “ouvir vivas às nações vitoriosas, aos aliados, a Carmona e Salazar, Estados Unidos, Inglaterra e Brasil e, ainda um único viva à Rússia em voz débil que não foi possível identificar”.

Mas houve quem pagasse com a prisão o excesso de entusiasmo. Em Ponte de Sôr, o secretário da Câmara Municipal deteve um jovem de 19 anos, carpinteiro, por ter dado um viva à Rússia . Conduzido ao posto da GNR “esteve dois dias detido, e depois de repreendido, foi entregue ao pai e à mãe, sem qualquer procedimento, em virtude de se tratar de um menor”.

As manifestações do dia 8 foram ricas em discursos e outras iniciativas que se estenderam pelos principais espaços públicos do país. Pelos relatos percebe-se que na maior parte dos casos existe uma estrutura organizativa que nem sempre afronta de forma aberta a situação, mas deixa recados nas entrelinhas.

Marca-se nova concentração para o dia 9. Anunciam-se, nomeadamente, novas manifestações de agradecimento frente às embaixadas Americana e Inglesa em Lisboa. As estruturas da oposição passam este apelo para fora da capital, mas entretanto Salazar coloca um travão na animação e proíbe novas concentrações.

Isso não impede, no entanto, que de Almada parta um enorme grupo de pessoas com o objectivo de atravessar o rio. A GNR local mobiliza todos os efectivos disponíveis e dirige-se para Cacilhas de modo a evitar a travessia para Lisboa. Apesar da multidão, não se registam incidentes e as pessoas desmobilizam…

A força da rua continua, no entanto, a sentir-se e a União Nacional aproveita-a, marcando para o dia 19 de Maio, um Sábado, uma grande manifestação de agradecimento a Salazar por este ter conseguido manter Portugal fora da Guerra… Milhares de pessoas de todo o país chegam à capital para esta demonstração de unidade nacional, mas essa é outra história.

Carlos Guerreiro

terça-feira, 30 de abril de 2013

O rapto de “Artist” em Lisboa

Johann “Johnny” Jebsen e Heinz Paul Moldenhauer chegaram aos escritórios dos serviços secretos militares alemães, a Abwehr, por volta das 18 horas. Os serviços funcionavam num complexo de apartamentos, anexos à Legação Alemã em Lisboa, no número 9 da Rua do Pau da Bandeira.

Tanto Jebsen como Moldenhauer eram agentes da organização e o convite feito por Aloys Schreiber, chefe da Abwehr na capital portuguesa, não parecia ter nada de estranho até porque o tema da conversa seria uma condecoração atribuída por Hitler a Jebsen.

Johnny Jebsen, à esquerda.

Para além de Schreiber encontravam-se nas instalações Helmut Bleil, oficial de comunicações da Abwher, e também Karl Meier, um civil, funcionário da Legação.

A conversa decorreu de forma normal durante alguns minutos até Schreiber pedir a Jebsen para este o acompanhar até outra sala. Ali informou-o de que não existia qualquer condecoração e que o objectivo do encontro era fazê-lo chegar a Berlim, mesmo que fosse necessário utilizar a força.

Jebsen tentou a fuga, mas foi derrubado com um murro e ficou inconsciente.

Quando acordou estava atado a uma cadeira. A seu lado encontrava-se Moldenhauer que tinha sido dominado por Meier. Schreiber informou-os sobre o que iria passar-se a seguir. Ambos seriam drogados, com um soporífero adquirido numa farmácia Lisboa, e metidos em duas malas de grande dimensão que já estavam preparadas. Depois seriam colocados num carro e transportados até Biarritz, em França.

Por volta das nove da noite do dia 30 de Abril de 1944 saia dos anexos da Legação Alemã um Studbaker sedan levando Schreiber, Bleil e Meier e duas malas com os adormecidos Jebsen e Moldenhauer.

Entre a meia noite e as duas da manhã o carro atravessou a fronteira entre Elvas e Badajoz. Tanto Bleil como Meier, devido às inúmeras viagens que haviam realizavam, tinham contactos entre a Guarda Fiscal e não foi feita qualquer revista à viatura ou criado qualquer entrave.

Depois de algumas paragens para descanso em Espanha chegaram a Irun, na fronteira franco-espanhola, por volta da meia noite desse mesmo dia e, pouco depois, em Biarritz, entregavam as “encomendas” ao responsável local da Abwehr. Chegava ao fim a “Operação Dora”.

Schreiber, que a tinha planeado e executado, seguindo ordens superiores, assegurou, durante um interrogatório americano em 1946, que não sabia em concreto das razões ou do destino quer de Jebsen, quer de Moldenhauer.


As várias vidas de “Artist”

Jebsen era conhecido por ser um mulherengo e um jogador. Tratava-se de um fumador e bebedor inveterado, com muitos contactos no mundo dos negócios e da finança. Extremamente versátil no jogo da intriga é ainda descrito, no livro “Jogo Duplo”, de Ben Macitire recentemente editado (ver AQUI), como um anti-nazi convicto.

Este rapto entre alemães vai colocar os serviços secretos britânicos em pânico. É que Jebsen era também “Artist”, um importante agente duplo, com conhecimentos do esquema ultra-secreto baptizado por ”Double Cross” que tinha como objectivo “alimentar” os serviços alemães com informações falsas.

Quase desde o início do conflito que os alemães tentaram infiltrar agentes no Reino Unido para obter informações. Um elevado número foi capturado ou entregaram-se voluntariamente, oferecendo-se para trocar de campo.

O grupo “Double Cross” integrava meia dúzia de agentes duplos que ainda hoje fazem parte do imaginário colectivo da II Guerra Mundial. Garbo, Trycicle ou Treasure são apenas os nomes de código de alguns desses agentes.

Já muito se escreveu sobre eles, tanto em Portugal como no estrangeiro, revelando os esquemas e as excentricidades deste pequeno grupo de personagens que, não fossem os documentos que têm vindo a surgir, seriam facilmente confundidos com ficção.

Estes agentes assumiram uma importância vital no esquema de ardis que levariam Hitler a acreditar que um desembarque em França aconteceria em Pas-de-Calais e não em Dunquerque.

Jebsen era amigo pessoal de Dusko Popov, aliás “Trycicle”, mais um importante elemento da rede “Double Cross”. Por recomendação deste último, e depois de várias vezes ter sugerido que sabia dos esquemas britânicos, foi recrutado. O agente da Abwehr começou a fornecer relatórios detalhados sobre as actividades nazis.

Aparentemente o rapto não está relacionado com estas actividades, mas sim com as inúmeras com algumas transações financeiras suspeitas e o medo de que ele se preparava para desertar.

Os serviços de espionagem militar alemães estavam envolvidos numa luta de morte com os serviços de espionagem das SS, os SD.

Esta não seria a primeira deserção nestes serviços e poderia significar o seu desmantelamento já que Hitler estava cada vez mais desconfiado em relação à sua eficácia e lealdade.

Para os britânicos e para os aliados o rapto poderia significar não só o fim da operação “Double Cross”, mas também um desastre de proporções inimagináveis. O desembarque na Normandia estava marcado para dali a semanas. Se Jebsen contasse o que sabia, todas as informações da suposta rede alemã no Reino Unido estariam em causa…

Se os alemães desconfiassem que os seus agentes estavam comprometidos bastaria uma analise critica a toda a informação enviada e uma dedução invertida: se dizem que é aqui que vai ser a invasão, então está acontecerá noutro local.

Apesar da sua aparente fragilidade Jebsen não terá confessado grande coisa durante os interrogatórios acompanhados de tortura. As últimas pistas apontam para a sua presença no campo de concentração de Sachsenhausen, de onde desapareceu depois de ter sido levado a Berlim para interrogatório, em Fevereiro de 1945.

Apesar dos esforços britânicos e de Popov, depois da guerra, o destino de “Artist” mantém-se uma incógnita.

Moldenhauer, que foi raptado apenas porque se encontrava de passagem pela casa de Jebsen em Lisboa, não sobreviveria à guerra.

Em Abril de 1945 os guardas SS de Sachenhausen obrigaram milhares de prisioneiros a fazer uma marcha forçada para escapar aos Russos. Muitos não chegaram ao fim. Heinz Paul Moldenhauer foi um deles…

Carlos Guerreiro
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quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Refugiados, donos das desgraças do mundo

É a última reportagem publicada por Walter Lucas no PM Daily antes de ser expulso.

Neste trabalho ele reforça a ideia de uma forte influência alemã em Portugal, mas acima de tudo destaca o drama dos refugiados, os seus medos e as suas esperanças.

Este conjunto de publicações sobre a expulsão do jornalista Walter Edward Lucas fica completa no dia 28 de Dezembro, com um artigo onde se resumem as várias páginas do processo de expulsão conduzidos pela Polícia de Vigilância e Defesa do Estado e pelo Secretariado da Propaganda Nacional.

LISBOA CHEIA DE ESPIÕES NAZIS
Como a Gestapo anda à caça de novas vítimas
POR W. E. LUCAS

Um distinto estadista português observou numa conversa particular, não há muitos meses, que sabia que cada alemão em Portugal era um espião. Muito embora não se possa tomar esta afirmação como absolutamente verdadeira, no fundo é um resumo perfeito do que se passa.

Os refugiados enchiam as esplandas da baixa de Lisboa, mas isso não era sinal de alegria.


Vêem-se muitos alemães pelas ruas de Lisboa. O que é que demónio podem eles fazer? Comparemos, por exemplo, o número de pessoas empregadas na Embaixada Inglesa e o das empregadas na Legação alemã, em Setembro de 1939. A primeira tinha cerca de dez, não contando com os empregados de escritório; a última mais de 40.

Além disso a grande agência alemã de viagens Stimar, cuja razão de ser desapareceu com o rebentar da guerra, albergava mais de vinte activos jovens nazis. Afirmava-se, muito embora não se possa confirmar, que a polícia portuguesa fez uma rusga a este organismo e encontrou ali grande quantidade de armas.

Um estudo da imprensa portuguesa feito com cuidado seria suficiente para mostrar a direcção dos acontecimentos. Tudo o que se publica em Portugal é controlado por uma censura forte e aparentemente absurda. Teoricamente a censura trabalha segundo as directrizes de uma estrita neutralidade. Os factos de qualquer dos lados em luta podem ser apresentados, mas é proibido qualquer comentário a não ser que não seja absolutamente nada comprometedor.

À medida que a guerra e as vitórias alemã traziam consigo um nervosismo sempre crescente, começou também a desenvolver-se na imprensa a tendência de apresentar as notícias de maneira a dar certo relevo às vitórias alemãs.

Mas mesmo que a censura não tivesse nisso interferência, os próprios alemães começaram a exercer influência na imprensa de maneira a encaminhá-la dentro da sua maneira de pensar.

A quando da invasão dos Países Baixos, “A Voz”, o principal jornal católico, manifestou ligeiros sentimentos de revolta contra este ataque não provocado. No dia seguinte circulava por Lisboa inteira uma carta aberta sugerindo não só que a interpretação dos factos apresentada pelo editor daquele jornal era errónea, mas ainda que era imprudente para ele próprio, editor, expressar tais opiniões.

Não é muito forte o controlo alemão exercido directamente sobre a imprensa, com o exercido em Espanha, principalmente porque a maioria dos directores e editores dos jornais de Lisboa não simpatizam com os nazis. Mas o que não pode ser feito pela imprensa local é levado a cabo por uma verdadeira corrente de propaganda alemã.

Para fortalecer o efeito desta larga e livre distribuição de literatura, uma quantidade de jornais e revistas alemãs decora as portas da maior parte das tabacarias das principais ruas de Lisboa.

Os restos do naufrágio espalharam-se por todas as ruas, cafés e hotéis de Lisboa, assim como muitas cidades da província.

Costumava dizer-se que, se alguém estava na ponte da Gálata, estaria certo de encontrar a tempo quási todas as pessoas que valesse a pena encontrar. Lisboa é a moderna ponte de Gálata.

Mas há outro lado do quadro.

Entre a multidão errante e em retirada há veteranos de guerra contra Hitler que fugiram porque as suas vidas estariam em perigo se fossem apanhados.

Além de soldados ingleses, polacos, belgas franceses, holandeses e checos, há membros daquela nova classe criminosa internacional, homens e mulheres que combateram e escreveram o que tinham a escrever e se encontraram, por consequência, sem um país e muitas vezes sem os necessários documentos.


A história de três mulheres

Se tivésseis entrado num café, no Rossio, há dias, teríeis ali visto três mulheres. Tinham uma aspecto vulgar, mas tinham a sua história.

Andaram durante anos de lado para lado e uma vez mais tinham de levar esta vida de nómadas porque sabiam o que lhes acontecia se não fossem sempre à frente do perseguidor.

Ao fugirem tiveram por companheiro Arthur Benjamin, um judeu alemão, jornalista distinto. O sr. Benjamin encontra-se hoje enterrado em qualquer sepultura vulgar nos Pirinéus, na fronteira espanhola.

Levantou-se qualquer dificuldade acerca do seu passaporte. Recebeu ordem para voltar para trás, para a França. Naquela noite tomou os trinta grãos de morfina que sempre trazia consigo para qualquer emergência desta natureza.

Num outro dia poderíamos encontrar , no “bar” inglês, um belga que tinha acabado de chegar dos subterrâneos da Gestapo de Madrid. Tendo atrás de si uma tal experiência, fica-se admirado com a sua fria resolução de ir para Inglaterra e continuar a luta que deixou em França.

Depois de se ouvir a sua história pode bem acreditar-se que, quando o Sr. Himmler visitou o lugar de tortura da inquisição de Barcelona, ficou desapontado, como se conta, ao ver que, pelo que diz respeito a ideias, nada de novo ali tinha encontrado. As gentes da Gestapo tentam em todos os “bares” encontrar os homens e mulheres que procuram.


Todos os estratagemas

Lisboa está cheia de gente. Homens e mulheres que transpuseram as vertentes áridas dos Pirineus ou conseguiram ir de França para África pelos caminhos mais estranhos. Aterreram em Espinho em aeroplanos roubados e muitos outros usaram todos os estratagemas para fugirem a-fim-de poderem continuar a luta contra Hitler em Inglaterra ou em outra qualquer parte.

Há desespero assim como coragem nas ruas de Lisboa.

Este porto de Portugal está a tornar-se uma armadilha para muitos. Todos os caminhos parecem estar fechados a não ser que se dê o caso de se ter a chave particular que as abra.

Há aqui pelo menos dois escritores distintos cujos nomes estão na lista especial das pessoas a que serão permitidas as entradas nos estados Unidos. Enquanto a maquinaria oficial de Washington range e geme para lhes abrir a porta da salvação, podem eles desaparecer no negro abismo.

Entretanto, os barcos para a América e os “Clippers” vão cheios de passageiros armados com os necessários documentos. Muitos destes receberam os seus documentos porque são ricos. O sofrimento e a necessidade de escapar não servem de critério nem para a concessão do visto nem para a da passagem.

(PM, 6 de Dezembro de 1940)

domingo, 25 de novembro de 2012

Fugitivos de Franco passaram por Lisboa


O diário espanhol “El País” consultou os arquivos da Embaixada Mexicana em Lisboa no período que se seguiu à 2ª Guerra Mundial e descobriu documentação relacionada com pelo menos meio milhar de refugiados espanhóis que escaparam através de Portugal para o México, com o apoio das autoridades daquele país.

Tratam-se de homens e mulheres que tinham lutado do lado republicano durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939).

Gilberto Bosques, Embaixador do México em Lisboa
Muitos tinham sido presos após ou durante o conflito, foram condenados à morte e depois indultados, mas com pesadas penas de prisão para cumprir.

Na perspectiva de cumprirem 20 ou 30 anos de cárcere tinham decidido fugir e o México a oferecia solidariedade a estes combatentes da democracia.

Outros tinham recebido indultos totais mas continuaram alvo de perseguições por parte de vizinhos, exército ou policia.

O apertar do cerco e o crescendo de ameaças também os fez fugir para Portugal.

Os interrogatórios são quase na totalidade na primeira pessoa e contam casos de resistência, tortura, dor e medo.

Para sobreviverem uns fizeram passar-se por loucos, outros viveram escondidos durante anos e há também quem tenha integrado grupos de guerrilheiros que continuaram a combater Franco até bastante depois do fim da guerra civil.

Os casos consultados referem-se aos anos entre 1946 e 1948.

No centro desta actividade estão Gilberto Bosques, o Embaixador do México em Lisboa, e o Unitarian Service Comitte, uma organização americana de apoio a refugiados que se tinha instalado em Lisboa durante a II Guerra Mundial.

Gilberto Bosques é uma personalidade bem conhecida no México pelo seu apoio aos refugiados da guerra civil espanhola, mas também a outros que durante os anos da Guerra Mundial procuravam uma fuga aos fascismos que controlavam vários países europeus.

No México foi construído há poucos anos um museu em sua memória (ver AQUI).

O papel do Unitarian  Service Comitte no nosso país durante estes anos está ainda por escrever.

Sabe-se que ajudaram muitos refugiados respublicanos - existem relatórios da PVDE sobre a sua actividade - e também recolheram e ajudaram muitas pessoas que escapavam de Hitler.

Nas Caldas da Rainha geriram uma quinta por onde também passaram aviadores internados no nosso país.

O artigo do El País refere ainda as dificuldades que estes republicanos enfrentavam quando entravam em Portugal.

O governo de Salazar tinha grande proximidade com o de Franco e os refugiados capturados eram devolvidos às autoridades do outro lado da fronteira.

O artigo completo do “EL País”, onde pode encontrar ligações para informações complementares e cópias de alguns dos documentos, pode ser lido AQUI.

Um artigo em português sobre o mesmo tema pode ser encontrado AQUI.

Boas leituras
Carlos Guerreiro

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Livros...
Lisboa - Uma Cidade em Tempo de Guerra

A Casa da Moeda lançou no dia 4 de Outubro o livro “Lisboa - Uma Cidade em Tempo de Guerra” de Margarida Magalhães Ramalho, uma obra que pode ser adquirida em Português, Espanhol e Inglês por cerca de 25 Euros.


Fica a sinopse oficial deste trabalho:

Lisboa. Uma Cidade em Tempo de Guerra: histórias verídicas sobre o impacto da Segunda Guerra Mundial

A Imprensa Nacional-Casa da Moeda (INCM) lançou, no dia 4 de outubro, a obra Lisboa. Uma Cidade em Tempo de Guerra, da historiadora Margarida de Magalhães Ramalho. Este é um livro de histórias verídicas sobre um período ímpar da história em Lisboa, a Segunda Guerra Mundial.

Em Lisboa. Uma Cidade em Tempo de Guerra, a autora aborda temas como os refugiados, as alterações que a presença destes provocou na capital lisboeta, as guerras da propaganda e as teias tecidas pela espionagem internacional.

Portugal desempenhou um papel importante nesta época, por se ter mantido neutro durante todo o conflito, recebendo milhares de refugiados, e Lisboa foi um dos raros portos livres da Europa. Por aqui passaram, em trânsito para os Estados Unidos, casas reais no exílio, membros do governo de países ocupados, militares, artistas famosos, cientistas e muitos intelectuais.

Esta circunstância extraordinária conferiu à capital portuguesa uma atividade a que os lisboetas não estavam acostumados, exercendo influência sobre a vida da cidade e alterando as vivências e o ambiente de uma Lisboa pacata, que quase se torna num cenário cinematográfico — a Lisboa dos espiões e dos refugiados de guerra.

“Este livro não é um livro de História, mas sim de histórias”, refere Margarida de Magalhães Ramalho. Lisboa. Uma Cidade em Tempo de Guerra é uma obra que transporta o leitor para a Lisboa do final da década de trinta e início da década de quarenta do século passado, através de testemunhos, muitas vezes na primeira pessoa, dos refugiados que procuraram Portugal como o último reduto europeu para quem já não encontrava segurança numa Europa em guerra.

Escrito como se fosse um roteiro, com cinco capítulos independentes que podem ser lidos ao sabor da vontade de cada um, os temas abordados apoiam-se em documentação de arquivo, registos de imprensa, citações bibliográficas e alguns testemunhos pessoais.

A pensar nos leitores que gostam de partir à descoberta da cidade, o livro é acompanhado de um guia desdobrável, típico dos anos de 1940, onde, num mapa da cidade, estão assinalados alguns percursos relacionados com o tema da obra.

Boas viagens pela Lisboa de outros tempos
Carlos Guerreiro 
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terça-feira, 6 de novembro de 2012

«Conferência Portugal e o Holocausto»
Judeus Portugueses abandonados na Europa

Milhares de refugiados estrangeiros encontraram em Portugal um refúgio, enquanto esperavam por um navio ou qualquer outro meio que lhes permitisse escapar da Europa.

Este aspecto, muitas vezes salientado ao longo dos últimos anos, não deixa de ser ensombrado pela decisão do Estado Novo de virar costas aos judeus de origem portuguesa que se encontravam em vários pontos do mundo e sob alçada do regime nazi.


Na maior parte dos casos tratavam-se de comunidades há muito afastadas do país – desde expulsão dos judeus no final do século XV – mas que continuavam a falar e a considerar-se portugueses.

O caso não é, de facto novo, mas mereceu novamente destaque durante a conferência "Portugal e o Holocausto" que decorreu em Lisboa na última semana.

Avraham Milgram, Investigador israelita do Yad Vashem de Jerusalém e autor do livro editado em 2010 “Portugal, Salazar e os Judeus”, referiu, nomeadamente, o caso dos judeus portugueses na Holanda e na Grécia que o Estado novo decidiu não ajudar, apesar dos apelos, transformando Salazar num cúmplice do aconteceu depois.

"O caso mais conhecido foi quando Salazar não reconheceu os quatro mil judeus de origem portuguesa, na Holanda, mas sem vínculo formal a Portugal.Este episódio faz de Salazar um cúmplice involuntário", disse Milgram, referindo também casos semelhantes de judeus portugueses da origem turca ou grega.

Há vários anos que diferentes pessoas chamam a atenção para este tema, nomeadamente, os jornalistas Nair Alexandra e António Melo, e também pela historiadora Irene Pimentel no seu livro "Judeus em Portugal durante a II Guerra Mundial".

Ainda recentemente estes casos merecerem de novo atenção no livro de Esther Mucznik, "Portugal no Holocausto", editado este ano e onde a  autora conta a história dos 4 mil judeus portugueses deportados da holanda, mas também de outros de Salónica e ainda de vários pontos da Europa (ver AQUI).

Avrahm Milgram disse durante a conferência que se criou – no final da guerra - uma memória positiva do regime, mas parcial, pois não abrange toda a história daquele período.

Carlos Guerreiro (com Lusa)
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