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sexta-feira, 21 de dezembro de 2018

Boas Festas...


A todos os que acompanham o "Aterrem em Portugal!" os desejos de Boas Festas na companhia de quem mais desejarem...

Carlos Guerreiro

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Salvamentos realizados por navios portugueses no Índico

O Oceano Índico parece uma teatro de operações distante e secundário, mas as difíceis ligações entre a Inglaterra e o Egipto através do mediterrâneo, onde alemães e italianos disputavam a supremacia no mar utilizando meios navais e aéreos, levaram os aliados e enviar um grande número de navios através da chamada  rota do cabo, contornando a África do Sul, subindo depois até ao Egipto.

O aviso Gonçalves Zarco foi um dos navios 
que realizou salvamentos no Índico durante a II Guerra Mundial.

O facto de muitas destas unidades viajarem sem qualquer escolta e as rotas afunilarem no Canal de Moçambique tornaram a zona bastante apetecível para a arma submarina e tanto os japoneses como os alemães tentaram a sua sorte, transformando as milhas de mar frente à colónia portuguesa numa verdadeira carreira de tiro.

A presença de unidades navais do Eixo fizeram-se sentir logo em 1939 com a presença de corsários e cruzadores auxiliares alemães, como o Admiral Graf Spee, ou da Régia Marina com alguns navios de superfície e submarinos baseados na Eritreia.

Esta presença não teve, no entanto, qualquer impacto em Moçambique e só partir de 1942 se sentiu a proximidade da guerra naquele território com a chegada em Junho de submarinos japoneses, e em Outubro de U-boats alemães. ao contrário do que acontece no Atlântico onde se regista um presença constante de submarinos, no Índico os ataques vão acontecer em vagas que duram de alguns dias a poucas semanas, desaparecendo em seguida.

A extensa linha de costa condicionou as operações de salvamento dos navios portugueses, que mesmo saindo muitas para realizar operações de socorro nem sempre conseguiam encontrar os náufragos antes destes chegarem a terra pelos próprios meios. Talvez por essa razão existem apenas cerca dezena e meia de operações de salvamento no Índico - protagonizadas por navios - que tiveram sucesso, enquanto no Atlântico esse número é superior a cinquenta. Por outro lado o número de arribadas no Atlântico e no Índico é muito semelhante, sendo no primeiro caso de 30 e no segundo de 29, segundo os dados apurados até ao momento.


Uma tragédia chamada Nova Scotia

O primeiro sinal da presença de submarinos no canal de Moçambique aconteceu a 5 de junho de 1942 com o afundamento do petroleiro panamiano Atlantic Gulf pelo submarino japonês I-10. Avisadas as autoridades em Lourenço Marques, foi enviado em socorro o Gonçalves Zarco que contou ainda com o apoio de um avião da companhia de aviação da colónia, a DETA, mas nada conseguiram encontrar. Os 38 sobreviventes chegariam à ilha de Gurué, sendo depois rebocados pela canhoeira Tete até ao porto da Beira, onde receberam o apoio necessário.

Um mês depois o Gonçalves Zarco seria responsável pela primeira operação de salvamento bem sucedida naquelas paragens, recolhendo dois dos 37 sobreviventes do cargueiro norueguês Wilford. Dezanove outros alcançaram uma ilhota ao largo da Beira e outros foram recolhidos por um cargueiro britânico.

A maior operação de socorro alguma vez realizada por navios portugueses seria protagonizada, ainda em 1942, pelo aviso Afonso de Albuquerque que se encontrava ancorada no porto de Lourenço Marques quando, na manhã de 28 de novembro, o U-177 apontou três dos seus torpedos a um navio de formas maciças que se deslocava para sul.

Tratava-se do “Nova Scotia” um paquete transformado em transporte de tropas que naquela viagem transportava mais de setecentos civis italianos internados, para além de duas centenas de guardas e tropas aliadas, num total de 1052 pessoas.

Quando o comandante alemão Robert Gysae emergiu para recolher informações sobre o navio que acabara de afundar, percebeu que no mar se falava italiano, então um país aliado. Comunicou de imediato com o seu Quartel-General na Alemanha, que reenviou mensagem para Lisboa onde os responsáveis pela Legação contactaram as autoridades marítimas portuguesas. Ao início da noite a informação chegou finalmente a bordo do “Afonso de Albuquerque” que conseguiu aprontar-se para zarpar na madrugada de 29.

Pouco depois das 13 horas o aviso já estava sobre a zona do desastre e foi confrontado com um cenário que dificilmente seria esquecido pela sua tripulação. A mancha de destroços estendia-se por milhas e entre madeiras, colchões e todo o tipo de materiais boiavam dezenas ou centenas de corpos.

O resgate decorreu de forma ininterrupta ao longo de 27 horas, retirando da água um total de 194 pessoas, sendo que cerca de 130 eram italianos. Mais de 850 morreram. Como corolário inédito da operação ficaram notas oficiais de agradecimento tanto das autoridades aliadas como do Eixo.

Foi também no índico que um navio português, o “Gonçalves Zarco”, retirou os últimos homens da água. Pertenciam ao britânico “Director”, afundado em 15 de julho de 1944 pelo submarino alemão U-198 e, curiosamente, a última dúzia de arribadas de que tenho notícia também tiveram lugar no Índico.

De entre as arribadas destaco o caso do Radbury, navio britânico do qual chegou um sobrevivente à ilha Europa em Novembro de 1944. Numa relação de salvamentos enviada pelo Departamento Marítimo da Colónia de Moçambique ao Ministério dos Negócios Estrangeiros existe uma nota que deixa perceber um caso de canibalismo, o único que encontrei até ao momento: “(…) Eram 40 sobreviventes que após três dias aportaram numa pequena ilha, sem árvores nem água, de areia onde encontraram ovos de aves e onde permaneceram dois meses. Por falta de água o sobrevivente e mais três companheiros abandonaram a ilha. Dez dias depois (…) o fogueiro (…) deitou-se à água e desapareceu. (…) o mesmo fez o artilheiro (…). O terceiro companheiro Ah Fong, marinheiro apertado pela sede morreu na jangada onde foi encontrado sem o antebraço e com a face corroída e irreconhecível. (…) Ignora-se o destino dos que ficaram na ilha”.

Carlos Guerreiro

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

Eduardo Neves e Melo, sobrinho de Rafael Nazareth Cardoso

Ontem recebi a notícia da morte de Eduardo Neves e Melo.

Eduardo Neves e Melo
Muitos de vocês - a maioria certamente - não sabem que era, mas tive o prazer de o conhecer em Fevereiro de 2013 no Espaço Memória dos Exílios, em Cascais, durante um encontro promovido para falar sobre o meu livro “Aterrem em Portugal!”.

O Eduardo trazia, num envelope, uma fotografia em grande formato que fez questão de me mostrar. Era do tio, Rafael Nazareth Cardoso, falecido em 1944, comandante do paquete Angola durante os primeiros anos da II Guerra Mundial e protagonista de um pequeno episódio de que na época me pareceu bastante rocambolesco: Tinha recebido dos alemães uma pequena caixa de madeira de ébano como agradecimento por ter ajudado o tripulante de um submarino daquele país.

Tinha também com ele a caixa. Era pequena, escura e tinha uma chapa de prata onde se lê: “Ao Cdte. Nazareth Cardoso em reconhecimento pelo seu acto humanitário. Em 19-11-1943. A Marinha de Guerra Alemã".

A história intrigou-me e nas semanas seguintes trocámos uns e-mails onde me deu mais pormenores sobre este familiar. Amante do mar quis entrar para a Armada, mas não conseguiu, razão porque se virou para a marinha mercante. Era apontado como alguém que cumpria escrupulosamente as regras e não facilitava. Era um germanófilo convicto e tinha até as poupanças numa banco alemão, razão porque deixou a mulher na ruína quando a guerra acabou. Nunca teve filhos.

Com os poucos dados que tinha consegui, ainda naquele mês de Fevereiro, descobrir mais alguns dados que confirmavam a distante e nebulosa história. No dia 19 de Novembro de 1943 o Angola foi inteceptado pelo U-103 que tinha a bordo um tripulante com tuberculose. Este último foi transferido para bordo do navio português para receber a assistência devida e os marinheiros alemães receberam ainda das mãos de um diplomata italiano que estava a bordo 3500 cigarros...

Ficámos os dois animadíssimos.

O comandante Nazareth Cardoso
com o Almirante Gago Coutinho..
.
Continuámos a trocar uns e-mails e a encontrar-nos aqui e ali de vez em quando. A história do tio vinha sempre à baila.

A partir de 2014 empenhei-me fortemente na recolha de material sobre as actividades das nossas marinhas - Armada, mercante e pesca - porque percebei que havia muito história não contada e que afinal eram tão espectaculares... A questão dos salvamentos realizados pelos nosso navios são o centro deste trabalho.

E foi aí que descobri de novo o nome de Nazareth Cardoso. Em 4 de maio de 1941, também como comandante do Angola, ele tinha recolhido 43 sobreviventes do cargueiro britânico Wray Castle...

Curiosamente o U-boat que afundou este navio foi o U-103, o mesmo que dois anos depois lhe pediu para acolher o homem tuberculoso.

Há uns meses consegui localizar os Diários de Navegação do Angola e na página correspondente ao dia 19 de Novembro de 1943 destaca-se uma nota  em alemão, de agradecimento, do comandante do u-boat alemão...

Ficámos de ir juntos ver o livro, mas já não foi possível.

Este blogue é também das pessoas que o lêem, que me procuram e que partilham as suas histórias. É um bocado de todos vós e, por isso, vai continuar a ser um pouco do Eduardo Neves e Melo...

Até um dia destes meu caro...

Carlos Guerreiro

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

Salvamentos da Armada no Atlântico

A primeira unidade da Marinha Portuguesa a realizar com sucesso uma operação de busca e salvamento de uma tripulação pertencente a um navio afundado por uma ação de guerra foi o contratorpedeiro “Dão”, em Agosto de 1940. Informado via rádio do ataque a um petroleiro britânico o capitão-de-fragata Arnaldo Moreira saiu de Ponta Delgada e encontrou relativamente depressa a mancha de destroços que marcava o local do incidente, mas os náufragos revelaram-se bem mais esquivos.

O contratorpedeiro Lima foi o navio da marinha
que fez mais salvamentos durante o período da II Guerra Mundial.

Apesar de todos os cálculos foram necessários quatro dias para perceber qual o destino dos 51 sobreviventes. No dia 16 o “Dão” conseguiu recolher 16 homens – os restantes chegaram pelos próprios meios a São Miguel – e depressa percebeu porque eles lhe tinham escapado durante tanto tempo: o submarino italiano Alessandro Malaspina, responsável pelo afundamento do “British Fame”, tinha rebocado os botes com os sobreviventes até à proximidade da ilha.

A unidade da armada que mais náufragos recolheu no Atlântico seria o contratorpedeiro “Lima” que em duas operações distintas encontrou um total de 229 pessoas, oriundas de três navios distintos. Na noite de 8 de Julho de 1942, sob o comando de Sarmento Rodrigues, foram avistados do navio fogachos de luz à distância. Dirigindo-se ao local descobriram uma primeira baleeira com gente do “Avila Star” e continuando as buscas foram encontradas mais duas, totalizando 110 pessoas, que foram posteriormente desembarcadas em São Miguel, nos Açores.

Outros 28 náufragos do mesmo navio foram encontradas pelo aviso “Pedro Nunes” que se fez ao mar quando o “Lima” avisou que estava a ficar sem combustível para continuar a sua missão. A Aviação Naval também deu uma importante ajuda na localização desta última baleeira.

Em Janeiro do ano seguinte a operação seria ainda mais dramática. Informado do afundamento do americano “City of Flint” o comandante Sarmento Rodrigues saiu em busca de possíveis náufragos e quando encontrou a primeira baleeira foi surpreendido pelo facto desta pertencer a outro cargueiro, o também americano “Júlia Wardhowe”. Entre os náufragos dos dois navios recolheram-se um total de 119 marinheiros, mas o mais difícil foi regressar a Ponta Delgada.

Apanhados por uma tempestade o contratorpedeiro português sofreu importantes avarias, houve tripulantes feridos e esteve sempre presente o receio de um desastre com consequências ainda mais graves. Um problema nas máquinas deixou o “Lima” “durante 45 minutos, atravessado ao mar, chegando a dar 67 graus de balanço e adormecendo apesar de ter, por precaução, enchido de água os tanques de nafta”, explica o comandante num dos seus relatórios.

Apesar de elevados estragos e aflições as gentes do “Lima” puderam contar com a satisfação de ter salvo vidas, algo que não tinha acontecido cerca de um mês antes com o "Dão" quando este saiu do porto para procurar, sem resultados, sobreviventes do paquete britânico “Ceramic”.

Saído a 7 de Dezembro percorreu um mar alteroso durante três dias sofrendo avultadas avarias: O mastaréu e a verga quebraram ficando pendurados; nos paióis da ré entrou grande quantidade de água salgada, acontecendo o mesmo na casa de máquinas e em todos os pontos do navio onde existiam escotilhas ou vigias expostas ao embate das ondas; quase todas as cavilhas dos balaústres estavam quebrados e destes últimos vários apresentavam-se torcidos, alguns em ângulos de 90 graus... A lista de estragos continua.

Sobre o "Ceramic" só se souberam mais pormenores no final da guerra. Apenas uma pessoa das mais de seiscentas sobreviveu, e só porque foi aprisionada a bordo do submarino que realizou o ataque, o U-515. Das restantes não houve mais notícias…

No Atlântico merece ainda destaque a operação realizada pelo contratorpedeiro Vouga que em agosto de 1941 protagonizou um “salvamento a pedido”, recolhendo 19 tripulantes do vapor alemão “Frankfurt”, um dos navios daquele país que no começo da guerra se tinha abrigado num porto neutro, bloqueado pela forte presença aliada no mar. Neste caso o porto de escolha fora no Chile onde se encontravam também outras unidades alemãs.

Tripulação do navio alemão Frankfurt chegando a Lisboa
depois de ter sido recolhida pelo contratorpedeiro Vouga.
Depois de dois anos “abrigado” o “Frankfurt” – reforçado com a tripulação de outros navios alemães mais lentos - partiu para dobrar o Cabo Horn em 17 de Maio de 1941, recolhendo-se depois no porto do Rio de Janeiro. O objectivo - ambicioso - passava por tentar uma corrida através do Atlântico em direcção à Alemanha.

No dia 26 de Junho partiram do porto brasileiro na máxima velocidade, mas a 4 de Agosto a aventura terminou ao serem interceptados pelo britânico “HMS Covina”. Para evitar que o cargueiro caísse em mãos inglesas a tripulação resolveu afundá-lo, refugiando-se em três baleeiras. Duas delas foram recolhidas pelo vaso de guerra inglês, mas os 19 homens da terceira aproveitaram a noite para se afastar o mais possível, evitar a captura e tentar chegar aos Açores.

No dia 7 avistaram ao longe um vapor. Temeram que fosse britânico ou de outro país do lado aliado, mas tratava-se do “Norden” com bandeira neutral do Panamá. Acreditaram que estariam salvos só que as coisas não correram como era esperado. Os panamianos estavam dispostos a levá-los, mas temiam que este tentassem tomar o navio e propunham que seguissem para Lisboa em situação de detenção numa cabine que seria fechada e vigiada.

Para os alemães essa hipótese não se punha e resolveram regressar à baleeira. Reforçados com abastecimentos oferecidos pelos panamianos tentaram chegar às ilhas portuguesas, mas ao fim da tarde do dia 9 foram surpreendidos pelo surgimento do “Vouga”.

O comandante do “Norden” tinha comunicado via rádio a localização dos alemães e o navio português, em Ponta Delgada, saiu logo pque pode para os localizar. No dia 13 de Agosto de 1941 entravam no porto e Lisboa, onde a Legação Alemão aproveitou a sua chegada para desenvolver uma intensa campanha de propaganda.

Segundo notícias publicadas na época também o “Lima”, que escoltava o “Carvalho Araújo” onde viajava o Presidente da República Óscar Carmona em visita oficial, recebeu ordens deste último para tentar localizar a baleeira... O Vouga teve mais sorte.

Carlos Guerreiro

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Salvamentos realizados no Atlântico por navios mercantes portugueses

Pouco depois de se dispararam os primeiros tiros do viria a ser um conflito que se prolongou por cerca de seis anos os portugueses puderam assistir em primeira mão aos efeitos da guerra com a chegada a Lisboa do navio holandês “Eidanger”, no dia 6 de Setembro de 1939, trazendo a bordo os náufragos do cargueiro britânico “Bósnia”, afundado dias antes.

Vinte e quatro horas depois entrava também na capital o “Carvalho Araújo” e o holandês “Maars” trazendo respectivamente 16 e 30 tripulantes do “Manaar”, afundado também por um submarino alemão dias antes.
O paquete "Angola" recolheu de uma vez 43 náufragos britânicos e de outra
o tripulantes de um submarino alemão que estava doente.
A descrição da batalha que afundou o “Manaar”, a chegada dos náufragos a bordo dos navios holandês e português e o tratamento dado aos feridos mereceu ampla cobertura dos jornais da época, com a publicação de longas reportagens, ilustradas com várias fotografias. Durante toda a guerra será aliás assídua a atenção da imprensa para com os salvamentos protagonizados pela frota nacional, tanto civil como militar, e para com os náufragos – especialmente em Lisboa e nas ilhas atlânticas – apesar do espaço ocupado pelo noticiário ter diminuído ao longo do tempo.

Com algumas dezenas de navios a atravessar o Atlântico em direcção às Américas do norte e do sul, às ilhas adjacentes e às ex-colónias africanas, cresceu rapidamente o registo de salvamentos realizados, especialmente nas áreas dos Açores e de Cabo Verde.

Em algumas situações são encontrados várias dezenas de náufragos de uma só vez, sendo os mais significativos o caso do “Tarrafal” que, em maio de 1941, recolheu 85 homens da guarnição do britânico “Clan MacDougall”, nas imediações da ilha de Santo Antão, Cabo Verde; do “Sines” que, em Março de 1943, no regresso dos EUA, acolheu 71 sobreviventes do americano “Keystone”; do veleiro “Sultana” que em julho de 1941, também em Cabo Verde recolheu 51 homens do britânico “Auditor” ou do paquete “Angola” que a 4 de maio de 1941 encontrou 43 tripulantes do cargueiro britânico “Wray Castle”.

Há ainda registo para algumas situações curiosas.

Em 19 de Julho de de 1942 o San Miguel, durante uma viagem aos EUA, foi parado por um submarino alemão que ordenou uma inspecção aos documentos e à carga do navio. Enquanto decorria a fiscalização aproximaram-se duas baleeiras com 29 náufragos do “Leonidas M.”, afundado horas antes. Entre as 17.30 e as 20 horas os sobreviventes do cargueiro grego esperaram pacientemente nos seus botes antes de arriscaram a subida a bordo do navio português, não fosse este também ser metido a pique...

Numa viagem aos EUA, em Março de 1942, o “Cunene” foi surpreendido por um U-boat que emergiu a umas dezenas de metros para o informar da existência de três baleeiras com náufragos poucas milhas a sudoeste. Eram 29 sobreviventes do norueguês “Svenor” que foram metidos a bordo e deixados em Filadélfia. No regresso a Lisboa o mesmo "Cunene" teria novo encontro com náufragos noruegueses, desta vez em número de 12 e pertencentes ao petroleiro "Koll".

Também o paquete “Angola” foi parado a 19 de Novembro de 1943 por um U-boat alemão quando vinha das colónias africanas em direcção ao Funchal. Desta vez o pedido de ajuda era para um tripulante do próprio submersível, doente com uma pneumonia. Sem condições para o tratar a bordo o comandante do submarino pediu ajuda ao capitão Nazareth Cardoso.

Este último não deixou qualquer referência ao acontecimento no Diário de Navegação do paquete português, mas o oficial germânico deixou por lá uma nota de agradecimento e mais tarde a Legação Alemã em Lisboa ofereceu-lhe um caixa em madeira de ébano como forma de agradecimento, que ainda hoje se mantém na família.

Estes são apenas alguns dos mais de cinquenta salvamentos realizados por navios portugueses ao longo da II Gerra Mundial. Na última semana tínhamos referido o caso do Alexandre Silva que salvou três tripulantes do Peleus. Prometemos trazer mais algumas histórias na próxima semana...

Carlos Guerreiro

terça-feira, 6 de novembro de 2018

Portugueses salvaram mais de dois mil náufragos durante a II Guerra Mundial

Navios portugueses retiraram do mar mais de dois mil náufragos durante o período da II Guerra Mundial. Os salvamentos aconteceram nos oceanos Atlântico e Índico e entre os homens e mulheres recolhidos encontra-se gente dos quatro cantos do mundo.

Tripulantes do "Manaar" chegando a Lisboa em 6 de Setembro de 1939.
O "Carvalho Araújo" salvou 16 dos seus tripulantes e o holandês "Maars" outros 30.
Todos chegaram à capital portuguesa no mesmo dia.

(Foto: Revista Ilustração, 16 de Setembro 1939)
Há cinco anos que reúno material sobre este tema e neste momento estou empenhado em concluir uma tese de mestrado sobre este tópico - ficam as minhas desculpas por ter deixado o "Aterrem em Portugal!" um pouco abandonado.

Na próxima sexta de manhã, durante as Jornadas do Mar que estão a decorrer na Escola Naval em Lisboa, vou abordar este assunto com alguma profundidade e prometo ir dando notícias sobre a evolução do trabalho.

De resto espero que a divulgação da evolução da tese também me traga novas informações, nomeadamente, de outros interessados neste tema e especialmente de familiares de marinheiros portugueses que tripulavam estes navios redentores... Agradeço, por mais esta razão, o máximo de partilhas deste texto.

Por agora deixo uma das dezenas de histórias que fui encontrando...


O caso Peleus

Pouco depois do meio-dia do dia 20 de Abril de 1944 o navio português Alexandre Silva encontrou sobre uma jangada três náufragos, ex-tripulantes do cargueiro grego “Peleus” que fora afundado mais de um mês antes – a 13 de Março – por um submarino alemão quando seguia sozinho na rota entre Freetown e Buenos Aires.

Mal sabiam os portugueses quando desembarcaram os três homens – dois de nacionalidade grega e um maltês – no Lobito, no dia 27 de Abril, que iriam abrir um dos capítulos mais negros da história da marinha alemã durante o período da II Guerra Mundial. Antonios Lissis, Dimitrios Argiros e Roco Said eram os únicos sobreviventes de um massacre perpetrado pelo comandante e alguns tripulantes do submarino alemão U-852.

O navio "Alexandre Silva", da Sociedade Geral.
No dia 13 de Março o “Peleus” tinha-se afundado em poucos minutos depois de ter sido atingido por dois torpedos. O submarino emergiu próximo dos tripulantes que tinham conseguido salvar-se, atirando-se à água, tentando agarrar-se às jangadas e outros destroços que flutuavam nas imediações.

O comandante alemão, Heinz-Wilhelm Eck, interrogou primeiro um dos oficiais gregos e depois ordenou que matassem todos os náufragos. Durante toda a noite foram atiradas granadas e feitos disparos de metralhadora que eliminaram a quase totalidade dos que estavam na água. Sobreviveram quatro tripulantes que conseguiram esconder-se em duas jangadas.

Antes de serem recolhidos pelo Alexandre Silva, da Sociedade Geral de Comércio Indústria e Transportes, um dos quatro homens morreu na sequência de ferimentos que tinha sofrido na sequência da explosão de uma granada.

Nos princípios de maio de 1944 o U-852 foi alvo de um ataque aéreo perto da costa da Somália, deixando-o com graves avarias que obrigaram a tripulação a encalhar o submersível junto à costa. A bordo os britânicos encontraram relatórios que referiam o afundamento de um navio no dia e na zona onde se registara o incidente com o Peleus.

Em Outubro de 1945 cinco elementos do U-852 foram formalmente julgados por crimes de guerra em Hamburgo. Condenados à morte Eck e dois outros oficiais seriam executados em Novembro do mesmo ano, ficando para a história como os únicos tripulantes de U-boat’s a sofrerem pena capital por crimes de guerra...

Carlos Guerreiro

sexta-feira, 26 de outubro de 2018

O Postalinho...
O espaço económico alemão


Um postal alemão de propaganda sem data, mas que certamente é de 1939 ou 1940, período em que a França ainda não tinha sido ocupada.

Tal como noutra propaganda alemã dá-se atenção é a questão económica que surge de forma recorrente em postais e noutras meios durante toda a guerra. Neste caso dá-se destaque ao número de consumidores do país que ultrapassa a população da Inglaterra e da França em conjunto.

Ainda em termos de linguagem e propaganda saliento o facto de entre as figuras que representam os alemães se encontrarem diversas crianças e até um bebé, enquanto para a França e para a Inglaterra surgem apenas adultos e quase todos homens... Um detalhe que tem algum efeito no inconsciente do observador menos atento.

Carlos Guerreiro

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Exposição "Trabalhadores forçados portugueses no III Reich" em Loulé

Se está pelo Algarve não pode perder a exposição “Trabalhadores forçados portugueses no III Reich e os Louletanos no sistema concentracionário nazi”, que se encontra na Casa Memória Engenheiro Duarte Pacheco, em Loulé, mesmo em frente à câmara.


Parte desta exposição já esteve em Lisboa, mas agora foi enriquecida com as histórias de muitos louletanos e outros algarvios que se viram envolvidos no sistema de campos de morte e de trabalho da Alemanha Nazi.

Acrescentou-se também uma área com a história da emigração louletana no princípio do século XX, elemento importante para compreender o que aconteceu durante a II Guerra Mundial, pois muitos dos portugueses que passarem pelos campos de concentração eram emigrantes em França ou saíram para a Alemanha atraídos por melhores salários.


Convém também ficar atento à promessa feita pela autarquia durante a inauguração. Estará para breve o relançamento do livro “A morte lenta: memórias dum sobrevivente de Buchenwald" escrito por Emile Henry, um francês que conseguiu chegar vivo ao fim da sua provação e escreveu este livro para que a sua memória não se dissipasse. A obra, publicado logo depois da guerra, foi escrito em português até porque o autor tinha uma grande paixão pelo país.

Ficaremos à espera.

Até lá pode visitar – até 8 de Dezembro – a exposição visitável de terça a sexta-feira, das 10h00 às 18h00, e aos sábados, das 9h30 às 16h00.

Carlos Guerreiro

quinta-feira, 2 de agosto de 2018

À procura dos homens do "British Fame"

Numa vasta extensão encontravam-se “destroços de todo o tipo” e uma grossa camada de óleo dava ao mar “um aspecto espelhento”, explicava o relatório do comandante do contratorpedeiro DÃO após encontrar provas da sorte de mais um navio às mãos dos submarinos do Eixo. A operação de busca e salvamento tinha começado um dia antes, sem grandes resultados e mesmo no campo de destroços “não apareceram cadáveres nem destroços de embarcações” salva-vidas.

O contratorpedeiro "Dão".
(Ilustração, 16 de Setembro 1936 - Hemeroteca Digital)
O capitão-de-fragata Arnaldo Guedes da Silva Moreira tinha recebido nota do afundamento do petroleiro inglês “BRITISH FAME”, de 8400 toneladas, pelas oito da manhã do dia 12 de Agosto de 1940, quando o capitão do porto de Ponta Delgada o informara de um SOS captado pela Marconi instalada no arquipélago. O ataque teria tido lugar 135 milhas a leste daquela cidade açoriana.

O aprontamento do contratorpedeiro tinha sido feito rapidamente e pelas 14.30 horas este abandonava o porto deslocando-se na máxima velocidade até ao local onde estariam náufragos à espera do socorro. Foram colocados vigias na ponte com binóculos, mas apesar do empenho a noite chegou sem que se localizassem destroços ou sobreviventes.

Acreditando que as baleeiras tivessem rumado à ilha de Santa Maria foi traçada uma rota nocturna percorrida a baixa velocidade e com luzes ligadas na esperança de detectar ou ser detectado por gente a precisar de assistência.

Sem qualquer novidade raiou a manhã, altura em localizaram a mancha de óleo e os restos do navio. Utilizando-o como ponto de partida foi estabelecido um perímetro de busca que levou os portugueses a percorrer 20 milhas na direcção Norte/ Sul e dez na direcção Este/Oeste. Com a certeza de que nenhum náufrago estaria já naquela área o contratorpedeiro iniciou nova exploração para Oeste, em ziguezagues que chegaram a cobrir cerca de 20 milhas de cada vez, mas mais uma vez não encontraram sinais de gente.

Arnaldo da Silva Moreira começou a acreditar que os náufragos teriam sido recolhidos por um qualquer navio que não comunicara esse facto para se proteger do ataque dos submarinos. Na tentativa de confirmar a suspeita ordenou a emissão, via rádio e de meia em meia hora, de uma mensagem pedindo para lhe ser comunicada a recolha de náufragos enquanto continuava a ziguezaguear em direcção a Ponta Delgada.

Pediu-se ainda a colaboração nas buscas ao paquete Carvalho Araújo, que se dirigia mais para sul, e ao Clipper da Panamerican que cruzava os céus açorianos entre os EUA e Lisboa e vice-versa.

Como entretanto de Lisboa chegara a informação de que os náufragos estariam a meio caminho de São Miguel, o DÃO voltou para trás e recomeçou a buscas 40 milhas a oeste do campo de destroços. Foi mais uma noite a baixa velocidade com o raiar do sol a não trazer novidades. Pelas 12.30 do dia 14 assinalava-se a entrada em Ponta Delgada: “Desgostoso pelo insucesso da comissão, que tão mal recompensara a canseira, boa vontade e preocupação de todos, continuava convencido no entanto que os náufragos já haviam sido recolhidos”, esclarece Silva Moreira no relatório elaborado posteriormente.

O fim da tarde do dia seguinte veio desmentir o capitão-de-fragata quando uma baleeira deu entrada em Vila Franca com os náufragos a assegurar que se tinham separado de outras duas embarcações na noite anterior. Chegaram também notícias, trazidas pelo capitão de Porto, de que se avistavam ao longe na Ponta do Arnel duas embarcações não se assemelhavam às utilizadas pelos pescadores locais.

De madrugada o DÃO voltou a sair, mas agora com o apoio de uma vedeta a gasolina para assegurar as buscas mais perto de terra. Pouco depois das duas da manhã recomeçaram as buscas e às 9.30 horas da manhã o contratorpedeiro avistou a vedeta que trazia já a reboque uma segunda das baleeira com náufragos, recolhida junto a terra. Entre esta embarcação e a que varara em Vila Franca no dia anterior contavam-se 29 homens, mas havia mais.

Depois de acolhidos a bordo um dos oficiais salvos relatou que na véspera perdera de vista o terceiro salva-vidas, e que este deveria estar para Oeste do local onde se encontravam. Seguindo nesse sentido foram detectados os 16 homens que faltavam. O último esquife era comandado pelo imediato que não conseguira ainda encontrar um local para se fazer a terra.

Todos os náufragos receberam de imediato uma refeição oferecida pela cozinha do navio, mas os marinheiros portugueses não se fizeram rogados na sua generosidade. Assistiu-se à oferta de roupa limpa, mais comida, e houve até dois praças que se ofereceram para desfazer as barbas de dias que muitos ostentavam.

Silva Moreira mostrou-se ainda surpreendido com reacção dos resgatados: “O seu moral era elevadíssimo. Se bem que aparentemente fatigados e necessitados de repouso, não se lhes ouviu um lamento ou queixume, não fizeram um pedido, não maldisseram de ninguém, nem do próprio submarino que os havia feito passar por aquele transe, cujo comandante, aliás, classificaram de gentlemen, pelo modo como os tratou”.

O “BRITISH FAME” fora afundado pelo submarino italiano Alessandro Malaspina, mas dera luta. A artilharia transportada pelos ingleses respondera ao ataque e a certa altura tinham obrigado o italiano a mergulhar, mas três horas depois do início do combate, após ser atingido pelo impacto de vários torpedos e disparos de peça, o navio tanque rendeu-se. Três dos seus homens tinham morrido.

O comandante do Malaspina, Mario Leoni, fez prisioneiro o capitão do navio e, num acto de humanidade, rebocou as baleeiras durante cerca de 40 milhas na direcção nordeste com o objectivo de as aproximar de terra, razão porque todas as buscas efectuados tinham dado tão fraco resultado…

Carlos Guerreiro

quinta-feira, 19 de julho de 2018

"Aqui Há História" da SIC mergulha no B-24 de Faro e no U-1277 das Angeiras

As reportagens "Aqui há História" que todos os anos, mais ou menos por esta altura, mergulham nas memórias portuguesas que se escondem no nosso mar, vão ser retomadas hoje na SIC e, dos quatro episódios, dois são dedicados a acontecimentos que tiveram lugar durante o período da II Guerra Mundial...

Veja aqui o resumo das reportagens 2018 da série "Aqui há História"

A primeira reportagem vai recordar a história do cargueiro nigeriano River Gurara que em fevereiro de 1989 não resistiu a uma tempestade e naufragou junto ao cabo Espichel. Nas próximas semanas os alvos dos mergulhos serão então o U-1277, afundado pela própria tripulação nas Angeiras, no concelho de Matosinhos, após o final da guerra e o B-24 que se despenhou no mar junto a Faro em 1943.

Ficam os resumos dos episódios deixados pelos Aurélio Faria e pela sua equipa...

U-1277 - ANGEIRAS
Submarino alemão U1277 afundado intencionalmente na madrugada de 3 de junho de 1945, no final da II Guerra Mundial, no largo da Praia do Cabo do Mundo, em Matosinhos.

Foi afundado pela própria tripulação. Os 47 marinheiros foram na sua grande maioria salvos pelos pescadores de Angeiras. Repousa agora a 30 metros de profundidade ao largo de Matosinhos.

B-24 - FARO
Em 1943, em plena batalha do Atlântico, um bombardeiro norte-americano despenhou-se e afundou-se ao largo da ilha de Faro.

6 tripulantes foram salvos por 3 pescadores algarvios num gesto heróico encoberto por Salazar.
A 100 km de Faro mas já na costa vicentina aconteceu outro episódio, - a batalha de Aljezur -, que o governo de Lisboa não conseguiu esconder.

Os destroços e os testemunhos são provas da passagem de aviões aliados e nazis por Portugal durante a Segunda Guerra Mundial.

Só para concluir o quarto e último episódio será dedicado ao rebocador Rhona que, em 1923, afundou na foz do Tejo...


quarta-feira, 11 de julho de 2018

Recordar a II Guerra Mundial em Aljezur e Vila do Bispo

Aljezur e Vila do Bispo, no Algarve, recordam no próximo fim-de-semana momentos distintos da II Guerra Mundial quando foram testemunhas de incidentes envolvendo aviões de diferentes nações beligerantes.

No sábado o centro das actividades será Aljezur. Passam esta semana 75 anos sobre o combate entre que envolveu três bombardeiros alemães Fw-200 Condor e caças de escolta a um comboio aliado. O confronto terminou com um avião alemão em chamas e a sua tripulação morta.

Entre outras iniciativas, no dia 14, será inaugurada uma exposição fotográfica e documental sobre o incidente e o tenente-coronel Kai Samulowitz, da Luftwaffe, apresenta os resultados de uma investigação que realizou nos últimos anos sobre este incidente.

Um nova edição do livro "A Batalha de Aljezur" de José Augusto Rodrigues será também apresentada.

No domingo, logo pela manhã, há uma romagem ao cemitério de Aljezur para prestar homenagem aos aviadores mortos e depor flores nas sepulturas. Segue-se uma visita ai memorial da Parede, o local onde o aparelho se despenhou.

Às 11 horas a comitiva segue para Vila do Bispo onde também será prestada homenagem aos dois aviadores britânicos ali sepultados. Tratam-se dos sargentos da RAF, Gilbert Orton e George Gibson, tripulantes de um hidroavião Catalina que explodiu sobre a Baía do Tonel em 1943.

Fica o programa completo:



quarta-feira, 20 de junho de 2018

Algumas perguntas a Joel Neto

"Meridiano 28" é o mais recente livro de Joel Neto, um romance de espionagem e mistério que tem os Açores como principal palco da intriga.

O livro vai revela ainda o ambiente de paz entre britânicos e alemães que se viveu no arquipélago durante grande parte do conflito. Para conhecer melhor esta obra que recupera memórias reais daquele período colocámos algumas perguntas ao autor.

Aterrem em Portugal: O seu livro tem por cenário os Açores durante a II Guerra Mundial. Porque escolheu este ambiente?
Joel Neto: Os Açores têm sido quase sempre o principal cenário dos meus romances. Talvez eu ainda não tenha esgotado o trabalho da identidade do povo das minhas ilhas, no que esta tem de próprio e, ao mesmo tempo, no que tem de exultantemente português.

Por outro lado, havia aquela história em concreto: a dos ingleses e alemães que haviam continuado em paz durante a II Guerra Mundial. Pareceu-me uma metáfora extraordinária, tanto para a guerra como para a paz. E um pressuposto poderoso: poderia a guerra ter sido evitada, afinal?


AP: Quando percebeu que havia assunto para um romance?
JN: Creio que os meus romances nascem de padrões. Têm nascido, pelo menos. Eu tinha a história dessas duas comunidades – entre outras mais pequenas – que estavam na Horta a desenvolver a telegrafia submarina e viviam em paz.

Depois apareceram-me os Clippers da Pan American, amarando em frente à cidade carregados de estrelas de cinema e campeões de boxe, estadistas e milionários. E depois começaram a despontar também no mar combates da Batalha do Atlântico a que os faialenses chegavam a assistir a partir de terra, alinhados na doca como num anfiteatro. De repente, havia um cosmo.

Para saber saber mais 
ou adquirir este livro clique AQUI

AP: Descreve momentos de convívio entre britânicos e alemães em plena guerra. Trata-se de ficção ou realidade?
JN: Eles viveram de facto em paz no Faial até à evacuação dos alemães, em 1943. E os alemães só foram evacuados porque, percebendo para que lado a guerra ia tombar, Salazar cedeu instalações nas ilhas aos Aliados.

De resto, aquelas famílias eram visitas de casa umas das outras. Dançavam o foxtrot e o quick step nas sociedades recreativas (orquestras proliferavam). E havia ténis, e croquet, e piqueniques, e expedições... Era uma elite extraordinária.

Ao pé da Horta dos anos 1940, o resto do país – mesmo Lisboa – era sombrio, triste e profundamente tacanho.


AP: E a espionagem também é central no enredo?
JN:  A história que move a personagem principal é a da possível presença no Faial, depois da guerra, de um operacional nazi. Eles esconderam-se por todo o lado, não foi? Porque não nos Açores também? Portanto, apesar de todas as linhas narrativas, creio que se pode dizer que a espionagem é a principal força motriz do romance. E Mr. Flavell gosta do gin do Peter Café...


AP: Sendo dos Açores, as histórias do tempo da guerra não lhe devem ser estranhas...
JN: Desde criança que ouço estas histórias, mas realmente nunca me tinha preocupado em determinar-lhes os contornos exactos. No fundo, a verdade ultrapassava em muito aquilo que eu imaginava. Não são só  os portugueses em geral que não conhecem o papel da ilha do Faial naqueles tempos tumultuosos e extraordinários: são os próprios açorianos.

Portanto, o material era excepcional, mas restava o desafio de escrever um romance que transcendesse esse material e, ao mesmo tempo, o respeitasse. Tive a felicidade de encontrar os beta-readers e o fact-checkers perfeitos. Nunca poderei agradecer-lhes o suficiente.

sexta-feira, 15 de junho de 2018

Morreu Rheinhard Hardegen, comandante do U-boat que afundou o Ganda

Com 105 anos faleceu no sábado, em Bremen, Rheinhard Hardegen o comandante de U-boats que foi responsável pelo afundamento do navio português Ganda em 20 de Junho de 1941, um ataque que causou cinco mortos.





Tratava-se certamente de um dos poucos comandantes de U-boats da II Guerra Mundial ainda vivos. No pós-1945 assumiu diversos cargos políticos no partido democrata cristão da Alemanha, o CDU, que suporta neste momento a  Chanceler Merkel.


Para ler a história do afundamento do Ganda clique AQUI.

terça-feira, 12 de junho de 2018

Votar para construir o monumento que recorda os salvamentos da II Guerra Mundial

Está aberta a votação do Orçamento Participativo Portugal relativo à construção do monumento que vai recordar as acções de salvamento protagonizadas por pescadores e outros marinheiros portugueses durante a II Guerra Mundial.



A participação é simples. Basta clicar AQUI e colocar o número do seu cartão do cidadão. Neste LINK pode também ler quais são os objectivos desta iniciativa que pretende reunir 120 mil euros para a construção da estrutura e apoiar acções paralelas.

Recordo que existem cinco milhões de euros para serem atribuídos desta forma aos projectos regionais e nacionais que forma eleitos pela população. Fico a aguardar a vossa colaboração...

Para saberem um pouco mais sobre o historial deste projecto que Michael Pease lidera há alguns pode clicar AQUI.

Sobre salvamentos feitos por navios portugueses encontra algumas histórias AQUI.

Sobre este tem escrevi um artigo com outros esclarecimentos que pode ser lido AQUI...

Carlos Guerreiro

terça-feira, 5 de junho de 2018

Autora de livro sobre família salva por Sousa Mendes está em Portugal

Joan Halperin, autora do livro "My Sister's Eyes” A Family Chronicle of Rescue and Loss During World War II", publicado o ano passado, e que conta a história do salvamento da sua família durante a II Guerra Mundial graças a vistos passados por Aristides de Sousa Mendes, vai estar em Portugal nos próximos dias.


Amanhã pode-se encontrá-la no Agrupamento de Escolas de Carregal do Sal, onde uma turma do nono ano está a realizar um trabalho relacionado com a obra publicada pela autora, envolvendo as disciplinas de Inglês e Educação Visual. No dia seguinte Halperin estará em Cabanas de Viriato.

As iniciativas, que contam com organização da Sousa Mendes Foundation, prosseguem dia 13 no auditório municipal da Figueira da Foz, cidade onde a família da autora esperou pelos vistos de saída de Portugal durante a guerra.

No dia seguinte estará entre as 14.30 horas e as 16.30 no Estoril, no espaço Memória dos Exílios, e depois das 17.30 na Biblioteca Museu República e Resistência, em Lisboa.

Joan Halperin é filha e neta de refugiados que receberam vistos de Aristides de Sousa Mendes e é responsável pelo serviço educativo da Sousa Mendes Foundation nos EUA.

O livro conta a história do salvamento de parte da sua família que partiu da Polónia, passou por Portugal e continuou até aos Estados Unidos.

Carlos Guerreiro

sexta-feira, 1 de junho de 2018

Familiares de tripulante de bombardeiro inglês visitam Portugal

Na última semana têm estado em Portugal os familiares de Edward Deschaine, um dos tripulantes do bombardeiro Lancaster, que realizou uma aterragem de emergência em Vila Chã, perto de Vila do Conde.


O grupo familiar organizou a viagem de modo  a passar pelos locais onde Edward, que faleceu o ano passado, também percorreu durante a curta estadia no país em 1943, nomeadamente, em Vila Chã, em Elvas - onde esteve internado à espera de ser repatriado - e Lisboa, a cidade de onde saiu de volta para a Guerra...


Ficam algumas fotografias de Vila Chã onde o Bruno Costa e o presidente da Junta de Freguesia, Benjamim Moreira, têm dinamizado um pequeno museu que recorda a história local e entre esta também este episódio... Recordo que em 2015 foi inaugurado um pequeno memorial junto ao sítio onde o aparelho aterrou.

Deixo também o texto que o Bruno Costa publicou ontem e que me autorizou a "roubar"...

"Ontem, 30.05.2018, tive o enorme privilégio de conhecer pessoalmente alguém com quem comunicava há algum tempo.

Familiares - duas filhas, uma neta e um genro - do tripulante Edward Deschaine do Bombardeiro Avro Lancaster, fizeram uma visita ao memorial da queda do bombardeiro e ao Museu “Memórias de uma Terra.”

De visita a Portugal, esta família Canadiana teve oportunidade de visitar os diferentes locais onde o seu pai passou após a queda e antes de voltar a Inglaterra.

Sabe-se que após a queda a tripulação esteve no Porto e em Elvas.

Sabe-se que Edward, Canadiano, estava ao serviço da Royal Air Force, no esquadrão 619.

Edward faleceu o ano passado com 95 anos.

Edward era responsável pela largada das bombas e ajuda na navegação.

Foi de facto um momento de enorme felicidade e emoção. Esta família teve também a oportunidade de conhecer algumas pessoas que testemunharam a queda do avião, “Tia Maria do Chiné” e “Tia Lourença” e ainda com a “Tia Alice Parruca”.

Agradeço imenso ao Sr. Nia a fantástica ajuda na tradução e ao Sr. Benjamim pela companhia nesta odisseia começada em 2015 com a criação de um vídeo sobre o acontecimento."


















Se quiser saber mais sobre este caso clique AQUI...

Carlos Guerreiro

quarta-feira, 30 de maio de 2018

Monumento aos pescadores que salvaram vidas na II Guerra Mundial

O monumento que homenageia os pescadores que salvaram os aviadores americanos frente a Faro durante a II Guerra Mundial poderá estar a alguns votos de distância.

Jaime Nunes, Manuel Mascarenhas e o filho que salvaram 
em 1943 seis aviadores americanos frente a Faro

Michael Pease, o promotor britânico que há anos tenta avançar com este projecto, candidatou a ideia ao programa de Orçamento Participativo de Portugal na área da cultura e viu as suas pretensões aprovadas. Entre outros iniciativas vai entrar na fase de votação ao público entre Junho e Setembro, e a sua conclusão passará a depender da vontade popular.

Michael Pease vem acarinhando este ideia há anos e já bateu a mil e uma portas para obter financiamento e outros apoios. Para a construção do monumento e outras iniciativas relacionadas está a solicitar um investimento de 120 mil euros.

Pontualmente este britânico residente no Algarve tem pedido a minha colaboração e, dentro das possibilidades tenho ajudado como posso, pouco para a magnitude da ideia. Simpaticamente solicitou também a minha cooperação nesta fase e, obviamente, disponibilizei-me para o efeito. Não entrámos em pormenores e quando - recentemente - acedi ao projecto verifiquei que este prevê, entre outras actividades, a publicação de uma segunda edição - revista e ampliada - do meu "Aterrem em Portuga!", o livro que revelou a história do bombardeiro que se despenhou em Faro e que o levou a acarinhar a ideia do monumento.

Agradeço, fico lisonjeado e disponível para fazer a parte que me compete, mas aconteça o que acontecer entendo que o principal é avançar com a construção do memorial. Não ficaria, no entanto, bem com a minha consciência se não clarificasse esta minha ligação ao projecto...

A partir de 11 de Junho voltarei a dar notícias para revelar como e onde se procederá à votação, algo que neste momento também não sei...

Pode aceder AQUI a todos os detalhes desta iniciativa de Michael Pease...

Carlos Guerreiro

segunda-feira, 28 de maio de 2018

sexta-feira, 25 de maio de 2018

Formação sobre Figueira da Foz durante a II Guerra Mundial


O auditório municipal da Figueira a Foz acolhe amanhã, sábado 26 de maio, entre as 10h00 e as 17h30, uma acção de formação de curta duração que tem como tema «A Figueira da Foz durante a 2.ª Guerra Mundial: refugiados e "turistas acidentais"».

Entre os tópicos a discutir vão estar a paisagem social da Figueira da Foz balnear, dramaticamente marcada pela presença durante a 2.ª Guerra Mundial, dos refugiados que escapavam aos nazis. O legado da presença de refugiados na Figueira da Foz é parte integrante do Património Material e Imaterial da cidade e o elo de ligação com um dos mais importantes períodos da história mundial e com as vastas redes de conhecimento que sobre ela se vêm produzindo.

Esta acção de formação, que se insere na programação do Ano Europeu do Património Europeu, tem a duração de 6 horas, é dirigida a docentes de todos os graus de ensino e não docentes e tem como formadoras Irene Vaquinhas (professora catedrática do departamento de História, Estudos Europeus, Arqueologia e Artes da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra) e Cláudia Ninhos (investigadora integrada do CHAM – Centro de Humanidades da Universidade Nova de Lisboa).

As sessões são de entrada livre, abertas a toda a população e garantem certificação a professores mediante inscrição obrigatória AQUI.

Fica o essencial do programa:
 - 10h00 – 13h00: Irene Vaquinhas - A Figueira da Foz na rota da fuga das guerras: de praia peninsular a residência fixa (1936-1945) (sessão com visita guiada)

- 14h30 – 17h30: Cláudia Ninhos - Promoção da educação sobre o Holocausto na sala de aula: disciplinas, fontes, ferramentas e metodologias (sessão teórico-prática).

Para mais informações clique AQUI.

Hotel Netto em Sintra


O António Fragoeiro, que acompanha o Aterrem em Portugal!, há vários anos, chamou-me a atenção para o facto da fotografia publicada ontem no artigo "Repatriamento de Americanos através de Lisboa", mostrar o Hotel Netto, de Sintra, um edifício que apesar de ainda existir esteve abandonado durante décadas.

Segundo o blogue "Restos de Colecção" esta unidade hoteleira abriu portas em 28 de maio de 1879, funcionando até aos anos 70, quando encerrou, tendo depois ficado ao abandono. Em 2016 terá sido vendido a uma sociedade que ali pretende abrir um hotel de charme...


Fica a iamgem quase 80 anos depois e o obrigado aos leitores atentos...

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Repatriamento de americanos através de Lisboa


Uma das muitas fotografias tiradas em Lisboa nos anos de 1940 e 1941 mostrando refugiados que procuravam escapar de Hitler. Neste caso a imagem não mostra judeus, minorias étnicas ou opositores do regime nazi, mas sim americanos que residiam em França e que optaram por procurar refúgio no seu país.

Calcula-se que só nos arredores de Paris viviam em 1939 cerca de 30 mil americanos, muitos deles tinham feito parte dos contingentes da I Guerra Mundial ou chegado no princípio dos anos 20 quando o dólar valia muito mais que o franco e a capital francesa – a cidade luz – era uma importante atracção para escritores, pintores e outros artistas. Após a invasão alemã muitos procuraram regressar aos EUA com as famílias.

Esta fotografia foi tirada em maio de 1941 em Lisboa e enviado para a imprensa internacional com a seguinte legenda:

"Parte dos cerca de mil cidadãos americanos que estão a ser repatriados de França, pela Cruz Vermelha, acenam felizes do balcão do seu hotel perto de Lisboa, onde esperam pelo regresso aos EUA num navio da American Export Line. Muitos pertencem a familiares de soldados da I Guerra Mundial que ficaram em França."

Carlos Guerreiro

segunda-feira, 14 de maio de 2018

Jornadas em Lisboa sobre o holocausto

A partir e amanhã o Instituto de História Contemporânea (IHC – NOVA FCSH) organiza umas jornadas abertas sobre a shoá e outros genocídios e crimes de massa nas instalações da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade NOVA de Lisboa. A inciativa conta com a co-organização e apoio do Mémorial de la Shoah (Musée et Centre de Documentation, Paris), da Memoshoá – Associação Memória e Ensino do Holocausto e do Instituto de Relações Internacionais (IPRI-NOVA).



É uma das primeiras iniciativas, em Portugal, a abordar as memórias do holocausto e de outros crimes de massa, contribuindo para uma análise crítica, transnacional e inter-geracional destas temáticas, razão porque o público-alvo desta iniciativa são os estudantes de História e de Ciência Política, bem como de outras Ciências Sociais ou Humanas.

As jornadas contarão com a intervenção de historiadores e investigadores em Ciência Política de Portugal e França, que abordarão, entre outros temas: a questão da memória e do esquecimento; os refugiados na Europa nos anos 30 e 40; os perpetradores nazis; a visão do mundo nacional-socialista e a ideologia salazarista; a atitude de Portugal face à Shoá; as atrocidades em massa e outros genocídios, entre os quais Timor Leste, Ruanda e ex-Jugoslávia; a violência em massa do estalinismo e a violência colonial.

A coordenação dos trabalhos está a cargo de Irene Pimentel (IHC – NOVA FCSH), Esther Mucznik (Memoshoá) e Bruno Boyer (Mémorial de la Shoah).

A inscrição é gratuita está aberta a todos e todas as interessadas, até ao limite dos lugares disponíveis. As inscrições devem ser feitas para o email jornadashoah@fcsh.unl.pt e o programa pode ser consultado AQUI.

Haverá tradução simultânea.